As melhores viagens são, por vezes, aquelas em que partimos ontem e regressamos muitos anos antes
01 junho 2019
Textos dos dias que correm
Pietà
Os biógrafos de Miguel Ângelo são unânimes em sublinhar a importância da figura materna na sua obra: perde a mãe desde criança, e em muitos momentos a sua arte será uma espécie de diálogo, evocação discreta ou puro grito, com esta figura ausente e, precisamente por isso, desmesuradamente presente.
Pensemos, por exemplo, na Pietà que se encontra na basílica de S. Pedro, no Vaticano, uma das imagens mais dolorosas e icónicas do cristianismo. A Mãe está sentada, e o Filho morto repousa no seu ventre. A Mãe tem um corpo enorme, capaz de acolher o corpo do Filho adulto, mas conserva o rosto de uma jovem em flor.
O corpo parece um bote, um salva-vidas, uma cidade-refúgio. O rosto, no entanto, desenha-se impávido, como se, através daquele sofrimento, olhasse para outro lugar, e se concentrasse não sobre aquela morte, mas na infância intacta do Filho.
É um enigma esta discordância aparente, e as hipóteses de explicação são numerosas: que Miguel Ângelo estivesse contagiado pelo neoplatonismo, segundo o qual a vida divina é impassível; que pretendesse reproduzir a forma dos rostos da escultura greco-romana, tão admirada pelo Renascimento; que citasse o teológico verso de Dante sobre os mistérios da Virgem, «filha do seu filho»; ou, simplesmente, que aquele rosto jovem fosse a imagem que um filho pode preservar da sua mãe perdida na infância.
D. José Tolentino Mendonça
In Avvenire
Trad.: Rui Jorge Martins
Imagem: "Pietà" (det.) | Miguel Ângelo | Basílica de S. Pedro, Vaticano
Publicado pelo SNPC em 31.05.2019
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7 comentários:
«... tempo de estar calado, e tempo de falar ...»
O poeta não se lembrou do Eclesiastes... Acabou numa série de comuns lugares.
Cumprimenta.
Com pena
Já que estou numa de mau feitio: o que significa «icónico/a»?
O poeta não sabe português. Sabes das modas...
Não tendo mudado de feitio, aqui vai uma Avé Maria que eu desconhecia.
Do polaco Michał Lorenc.
Em: https://www.youtube.com/watch?v=X3zZLcsZQQM
Oiçamo-la por nós todos.
Continuando o mau feitio...
Há muito poucas gravações desta Avé Maria no YouTube. Nas minhas procuras encontrei, há pouco, esta. Creio ser não só a mais bem cantada mas a que mais bem segue a oração:
Voytek Soko - "Ave Maria" M. Lorenc, em:
https://www.youtube.com/watch?v=wPsSL_k7sVc
Ave Maria, gratia plena, Dominus tecum.
benedicta tu in mulieribus, et benedictus fructus ventris tui, Jesus.
Sancta María, Mater Dei, ora pro nobis peccatoribus nunc et in hora mortis nostrae.
Fez bem em divulgar esta Ave Maria. Michał Lorenc merece-o.
Apesar do dúbio e, por isso, criticável «Ouvi um pouco e gostei muito».
«uma das imagens mais dolorosas e icónicas do cristianismo» escreveu o poeta. Apesar de parecer ser norma perdoar tudo aos poetas, eu não perdoo nada a este poeta. Tem cultura e tem a obrigação (daí derivada) de não escrever patetices.
Foi sempre um burocrata muito bem ligado à Igreja romana.
E Vexa escreve «Pergunto, não tendo opinião formada...» acerca do sentido da utilização da palavra. Ainda bem. Muita coisa se lê nos dicionários. Mas nem só no que Vexa adopta.
Caro anónimo,
O que não será dúbio, menos ainda criticável, é a minha mais absoluta transparência. Como aconteceu consigo - mas sobretudo com outras pessoas que me "apresentam" músicas pelos motivos mais prosaicos - nem sempre tenho disponibilidade mental para as ouvir. Por vezes fenece-me a criatividade para alimentar o blogue, pelo que aproveito uma sugestão da mesma maneira que uma criança (talvez a do Gedeão) apanha uma bola colorida - com encanto. Depois leio tudo, oiço tudo, mas já me parece despiciendo voltar ao tema.
Ouvi a "sua" Ave-Maria. Toda, do principio ao fim, até ao momento em que se reza "agora e na hora da nossa morte". Que é antecedida por "rogai por nós pecadores".
É sempre um gosto lê-lo, ainda que se sintam laivos de algum desencanto (que me parece uma palavra educada). Se um dia quiser, o meu estabelecimento está aberto para a sua criatividade semanal. Gostaria?
Sempre a considerá-lo, quand même.
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