Depois da esperança, qualquer paz
Reconciliamo-nos sempre.
No fundo, e às vezes nem muito ao fundo,
a reconciliação nos espreita,
de lágrima ou de sexo. Às vezes,
nem sequer disso: a poalha dispersa
que o sol define em branda agitação,
ou mesmo a própria luz num reflexo
(quanto mais breve e modesto melhor emociona)
lhe bastam.
Espreita-nos para que aceitemos, para que
pensemos noutra coisa ou nesse refúgio das pequenas coisas
que é, diz-se, não pensar em nada.
reconciliamo-nos pois. E amamos logo tudo,
ou, mais subtilmente, fingimos que do tudo
apenas uns sinais, algo de nobre
e muito humilde. Assim
como se a solidão se acompanhasse
de muitas outras reconciliações humanas, simultâneas,
paralelas, mas não connosco, de outrem.
Quase mais que a nossa própria nos espreita
a reconciliação, suposta apenas, de outros.
Jorge de Sena
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