Ramadão. É o nono mês do calendário islâmico, durante o qual os muçulmanos praticam o jejum ritual, o quarto dos cinco pilares do Islão (fonte: Wikipédia). Um destes dias conversava com um amigo que iria jantar com diplomatas paquistaneses e indianos e, como estamos no Ramadão, o tema veio à baila. Hoje, dia 24 de Agosto, um muçulmano cumpridor que viva em Portugal não ingerirá alimentos líquidos nem sólidos entre as 7.03h e as 20.17h. A mim, confesso, dá que pensar: na diferença entre os sacrifícios católicos e muçulmanos; nos excessos que se farão a partir do pôr-do-sol; nas artimanhas de alguns patrões, dormindo de dia e trabalhando de noite; no valor que o nosso Deus (porque é o mesmo) dará a quem é obrigado, nos países árabes, por exemplo, a trabalhar com 50ºC sem água.
Jantar. Ontem, numa roda pequena de amigos, alguém se referiu a fulano dizendo: beltrano diz-me que não é boa peça. Eu não conheço fulano - nem a pessoa que veiculou o comentário o conhece. Encontrámo-nos uma vez e, se nos cruzarmos na rua, não saberemos identificar-nos. Mas, da próxima vez que encontrar ou ouvir falar de fulano, terei bem presente a informação de que não será boa peça. É espantoso a rapidez com que, baseado numa opinião que não faço ideia se é fidedigna - e nem sequer me interessa -, formei uma ideia sobre uma pessoa.
Velhos. Por motivos que não vêm ao caso, voltei, no Domingo, a visitar os meus velhos no lar. Por motivos idênticos visitei um casal de idosos que cumpriam 50 anos de casados. Entrei pela cozinha de uma casa humilde e com um cheiro pouco agradável. No quarto, acamado, o marido, recém-chegado do Alcoitão. Meio paralisado, com um palavreado ininteligível, celebrou, sabe Deus com que entendimento, as suas bodas de ouro, com a mulher dedicada ao lado. Era a terceira vez, nesse dia, que lia o Evangelho, tão bem comentado pela maf dois posts abaixo. E lembrei-me da porta estreita por onde temos de passar. Há portas bem estreitas, de facto...
Livros. Nem a propósito do parágrafo acima, comecei há poucos dias a ler a máquina de fazer espanhóis (valter hugo mãe, Ed. Alfaguara). Socorro-me da contracapa: o que mudará na vida de antónio silva, com oitenta e quatro anos, no dia em que violentamente o seu mundo se transforma? O que se sabe lendo as primeiras páginas? Depois de enviuvar, antónio silva é atirado pelos filhos para um lar da terceira idade.
JdB
5 comentários:
Gosto deste seu Moleskine e do saltitar de assuntos: gostei de o ver escrever, com tanta clareza, que o nosso Deus é o mesmo dos Muçulmanos. Nem todos os Católicos o fazem. Gostei da sua crítica velada, ou nem tanto, ao gossip social. Pela calada, pode realmente ser demolidor. Bem diz um dos 10 Mandamentos: não julgarás (ou qualquer coisa do género). Não é por acaso que está incluído no conjunto de "regras" que regem os cristãos deste mundo. Também gostei muito dos "seus" velhinhos. Good stuff, como diria uma amiga minha australiana! pcp
Estas suas reflexões dão que pensar.
Obrigada por continuar a desinstalar-me.
Beijinhos
Sobre a velhice, a Idade Terceira (como uma ilha, sim, como uma ilha), há um livro de poesia absolutamente pungente e pertinente: 'Velhos', de Jorge Gomes Miranda, Edições Teatro de Vila Real, 2008.
Lê-lo é um imperativo de consciência.
Muito obrigado por nos relembrar o óbvio, mesmo que por vielas e travessas.
Flores,
gi.
João, vamos por partes:
Ramadão: pergunto-me, sobretudo, se Deus dará grande valor aos rituais. Na minha concepção, Deus privilegiaria sempre a substância à forma, o diálogo ao «papagueio», a relação criativa à rotineira e o exercício espontâneo da bondade à troca de rezas por favores. Mas é bem possível que não seja nada assim. Acredito nEle, mas não estou certa de O conhecer pessoalmente.
Jantar: Gosto de formar as minhas próprias opiniões. Mas, às vezes, uma informação factual (mais do que uma opinião) alheia pode ser muito útil, como apresentação ou alerta… ;-D
Velhos e Livros: … (pensando tristemente) …
Obrigado a todos pela vossa visita.
algumas repostas breves a algumas interpelações: Deus dará, privilegiará, obviamente, a substância à forma. Estou convencido que a existência dos rituais - na "nossa" Igreja Católica as missas, sobretudo - são um caminho, não um fim em si mesmo. Os rituais não eliminam o resto, se bem que alguns se fiquem pelo que é rotineiro e visível. No meu caso, o ritual (a missa) foi o ponto de partida para outras coisas. Noutros o caminho será o inverso. No entanto, o que eu queria realçar era, principalmente, o exagero e incongruência dos sacrifícios (basta ir a Fátima) que, estou convencido, comovem pouco o Criador...
Sobre a Idade Terceira. Havia tanto a dizer sobre isso...
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