08 setembro 2021

Das montras e do pudor

Penafiel, Setembro de 2021

 Sou de um tempo e de uma educação com pudor de linguagem: só entre homens é que se diziam palavrões, podia dizer-se merda mas a expressão gaja era proibida; havia palavras feias, como sovaco, virilha ou ânus ou seio que não se pronunciavam não porque fossem verdadeiramente feias (gosto de Estômbar, não gosto de craca) mas porque remetiam para zonas do corpo de que não se falavam ou que eram domínio de uma certa intimidade. Em bom rigor, e não porque fosse uma palavra feia, também não se dizia cancro, mas uma coisa má. A fealdade das palavras era definida, não pelo seu som, mas por aquilo que representavam. 

Há 50 anos ou mais, talvez, as senhoras não tinham ovários, pelo mesmos motivo que os homens não tinham testículos.  Se uma amiga da minha mãe tivesse de ser operada a essa zona do corpo, fazia-se menção de forma discreta a coisas de senhora ou lá em baixo. O pudor da linguagem atingia um nível que não sei qualificar quando a referência a esses orgãos femininos era feita através da expressão miudezas

Vale a pena conhecer Penafiel - e um dia destes posto aqui algumas fotografias. Nunca lá tinha estado e fiquei muito agradado com a parte velha da cidade: cuidada, limpa, característica. Passar por Penafiel é, também, passar pelo mundo das miudezas que, segundo a tabuleta que encima a entrada, vende lingerie e têxteis para o lar. Ver esta palavra assim exposta fez-me recuar 50 anos, quando miudezas não era bem lingerie, menos ainda têxteis para o lar...

JdB   

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