06 novembro 2008

Ontem foi feriado no Quénia


Confesso. Nunca gostei muito de blogs. Ou blogues. Provavelmente, porque não é fácil encontrar os mais interessantes. E passo a presunção, porque esta minha colaboração também não deverá cair no capítulo do interessante. Mas os blogs são isso mesmo, um sinal – se não mesmo a essência – destes tempos de democratização da informação e isso, só por si, já vale a pena. Quem quer bloga, quem não quer, fica como está.

Eu aqui estou, a convite do JB. Não me custou dizer que sim, embora um “não” me desse muito menos trabalho. É provável ­­– mais do que certo - que tenha sucumbido ao tema que deu o mote a este Adeus, Até ao Meu Regresso. Zimbabué. Só o eco das sílabas no céu-da-boca já me é irresistível. Atiram-me para esse grande continente de onde só nos chegam, na esmagadora maioria das vezes, as más notícias. Como disse um dia uma jornalista inglesa a propósito do Congo, de onde chegam, de novo, más notícias, o país “parece o céu” mas “vive-se no inferno”.

E contudo, África mantém-se um mistério. Regressa-se uma segunda vez, ou terceira, ou quarta e tudo mudou. Normalmente para pior. Poucas vezes para melhor. Na maioria das vezes, para uma outra versão de África que não é a que aparece nas televisões – um bom exemplo é o Zimbabué que JB foi descrevendo aqui ao longo de dois meses. Outro exemplo é a Viagem por África que Paul Theroux escreveu em 2002. Uma viagem do Cairo à Cidade do Cabo de comboio, canoa, alguns táxis, uma única ligação aérea, mas também de matatu (Quénia), chapa (Moçambique), candongueiro (Angola), kombi (Botswana), tanka tanka (Gâmbia), tro-tro (Gana), teksi (África do Sul), dala-dala (Tanzânia), ou tshova (Zimbabué), seja qual for a língua utilizada no continente para chamar aos táxis colectivos – sobrelotados, pouco seguros, perigosos mesmo, mas sempre viveiros de personagens, histórias de vida, de engenho e de sobrevivência.

Theroux regressa ao continente quatro décadas depois da primeira visita. Está lá tudo: amargura, desilusão, medo, raiva, surpresa. Mas está lá também essa imensa vastidão recheada de todas as possibilidades. Indomável. Alguém disse um dia a Alberto Moravia – que ele cita nas suas Promenades Africaines: “Se o avião cair, a floresta abrir-se-á para voltar a fechar-se. E é tudo.”

Tudo efémero. E tudo possível. “The world has changed”, dizia-me ontem um bom amigo às primeiras horas da madrugada. Obama é o próximo inquilino da Casa Branca. O Quénia declarou feriado nacional e anunciou dois dias de festa. África tem razões para continuar a sonhar com as boas notícias.

Para pensar
O site do autor de Viagem por África (Quetzal, 2002) – Dark Star Safari, no original. Onde apetece comprar livros de viagem ao quilo. Em http://www.paultheroux.com/

Para conhecer
O projecto de 30 milhões de euros da Fundação Greg Carr, filantropo norte-americano, para recuperar o brilho do Parque Nacional da Gorongosa. Onde apetece começar a fazer as malas. Em http://www.gorongosa.net/

Para sorrir
Dedicado ao engenho africano ou, citando o respectivo lema, Solving everyday problems with African ingenuity – esta semana, um abre-garrafas do Togo. Onde se parte à descoberta de coisas simples. Em http://www.afrigadget.com/

Para acompanhar todos os anteriores
A voz de Stella Mendonça, a soprano moçambicana que também canta no novo clip publicitário ao turismo em Moçambique (Mozambique – Land of Contrast), realizado no Parque Nacional do Limpopo, que vai estrear a 11 de Novembro no World Travel Market, em Londres. Onde Stella é acompanhada pela soprano Sonia Mocumbi, também moçambicana, e por 53 músicos da orquestra sinfónica francesa de Pontarlier. As fotografias da rodagem do filme podem ser vistas em http://www.stellamendonca.com/. Enquanto esperamos pelo vídeo.

Mónica Bello

2 comentários:

rita ferro disse...

Boa estreia, Mónica, estarei aqui todas as semanas para te ler e gozar da tua prosa! Agora não falhes, ouviste? Vou seguir algumas das tuas sugestões... sou um ser humilde de vez em quando, LOL Enfim: depende do interlocutor... Abraço optimista, até para a semana!

ana v. disse...

E no entanto esta é uma entrada de alguém que percebe exactamente o que é um blog... ou blogue. Verdadeiro serviço público, diria eu.
Vou ficar freguesa das quintas-feiras também, claro.

Acerca de mim

Arquivo do blogue