03 junho 2013

Vai um gin do Peter's?


Há reflexões espantosas, que nos ajudam a ver a realidade com outros olhos! Aguçam-nos e purificam-nos o olhar. Coleccionei um par delas para ganharmos fôlego, neste mês de Junho, em que o Verão começa a despontar e as férias se aproximam...

 RASGAR O HORIZONTE DO AMOR

Para saber qual é o motor de ignição do amor, as crianças e os poetas são dos melhores mestres para uma resposta rápida, out of the box e muito certeira. Assim, aqui vai a observação de um poeta, jesuíta (Vasco Pinto Magalhães, SJ), que tem a coragem de focar sempre o lado luminoso da vida, como espelha o título de um dos seus livros: «Onde há crise, há esperança»(1):

«A primeira característica do amor é a inteligência. Se o amor não é inteligente, não é humano e até nem sequer é amor! Amor é compreender o outro, dar-lhe o lugar certo, ir ao encontro das suas necessidades e dar-lhe equilibradamente o que ele precisa e eu lhe posso dar. Ora isso só se faz com inteligência, com uma sensibilidade que sabe discernir. Inteligência quer dizer "ler por dentro" a realidade. Posse e prazer são uma caricatura do amor. Entregar-se e acolher inteligentemente é próprio de quem ama. Aqui o grande modelo é Cristo.»

Bom, e se adensarmos a reflexão e arriscarmos falar de felicidade, acreditando (eis o busílis da questão:) que é possível ser feliz?  

«Um grande filósofo, escrevendo sobre o amor e a felicidade, disse que a união diferencia! Sim, não só a união se enriquece com as diferenças, pois a comunhão não é confusão nem somatório (e dois iguais nada de novo acrescentam), como a comunhão esclarece e purifica as diferenças, pois faz apurar e clarificar o papel de cada um na sua complementaridade. O igualitarismo, de etnia, de sexo, de cultura ou de religião, tem como consequência um mundo e uma humanidade empobrecidos.»


O PORTO NA MIRA DE ARTISTAS NACIONAIS

Uma resenha engraçada de citações de escritores portugueses foi reunida há um par de anos, incidindo sobre a cidade Invicta, que o actor John Malkovitch considera a cidade mais romântica do mundo.  


 «Toda a cidade, com as agulhas dos templos, as torres cinzentas, os pátios e os muros em que se cavam escadas, varandas com os seus restos de tapetes de quarto dependurados e o estripado dos seus interiores ao sol fresco, tem toda ela uma forma, uma alma de muralha.»
Agustina Bessa Luís

«Se na nossa cidade há muito quem troque o b por v, há quem pouco troque a liberdade pela servidão.»
Almeida Garret

«Uma ida ao Porto é sempre uma lição de portuguesismo, tanto mais rica quanto mais raramente lá se vai. É indispensável – claro! – um mínimo de contacto reiterado com esse lar da nação para nele vermos algumas das significações latentes que enriquecem a nossa consciência de práticas.»
Vitorino Nemésio

«Lisboa inveja ao Porto a sua riqueza, o seu comércio, as suas belas ruas novas, o conforto das suas casas, a solidez das suas fortunas, a seriedade do seu bem estar. O Porto inveja a Lisboa a Corte, o Rei, as Câmaras, S.Carlos e o Martinho. Detestam-se!»
Eça de Queiroz

«O Porto não é em rigor uma cidade: é uma família. Quando algum mal acomete, todos o sentem com a mesma intensidade; quando desejam alguma coisa, todos a desejam ao mesmo tempo. Os portuenses são tão ciosos da integridade da sua cidade, como os portugueses em geral na integridade da nação.»
João Chagas

«O Porto ergue-se em anfiteatro sobre o esteiro do Douro e reclina-se no seu leito de granito. Guardador de três províncias e tendo nas mãos as chaves dos haveres delas, o seu aspecto é severo e altivo, como o de mordomo de casa abastada.»
Alexandre Herculano


«Afinal, o Porto, para verdadeiramente honrar o nome que tem, é, primeiro que tudo, este largo regaço aberto para o rio, mas que só do rio se vê, ou então, por estreitas bocas fechadas por muretes, pode o viajante debruçar-se para o ar livre e ter a ilusão de que todo o Porto é a Ribeira.»
José Saramago

«O portuense não gosta de Lisboa. Não gosta da polícia. Não gosta da autoridade. Da autoridade vingam-se, desprezando-a. Da polícia vinga-se resistindo-lhe. De Lisboa vinga-se, recebendo os lisboetas com a mais amável hospitalidade e com a mais obsequiada bizarria.»
Ramalho Ortigão

«E quanto ao riso, o Porto gosta de rir com uma certa insolência: ri mais desbragadamente, mais primariamente, mais saudavelmente e com mais gosto do que Lisboa.»
Vasco Graça Moura

«O Porto é o lugar onde para mim começam as maravilhas e todas as angústias»
                                                                                                                          Sophia de Mello Breyner


HITCHCOCK VISTO NA INTIMIDADE – SURPREENDENTE

Num artigo(2), gentilmente cedido pelo autor (da família), José Maria André desvenda uma faceta desconhecida e imprevisível do grande realizador norte-americano!

«Suspense»! Meandros secretos do cinema
O tema de hoje é Alfred Hitchcok, pai do «suspense», recordando o aniversário da sua morte, ocorrido há dias. (…)

O mundo inteiro ouviu falar de Hitchcock. Realizou mais de meia centena de filmes, que geraram um entusiasmo extraordinário e foram sucessos de bilheteira. O êxito foi de tal forma, que os dicionários de inglês têm a palavra «Hitchcockian», para designar filmes emocionantes. A cada filme, surgia a pergunta: será desta, que ele recebe o seu primeiro Oscar? A pergunta repetiu-se todos os anos, ao longo de sessenta anos de carreira brilhante. O Oscar nunca chegou.

Foi proposto 5 vezes para o Oscar de melhor realizador, propuseram-no 6 vezes para o prémio da DGA («Directors Guild of America»), propuseram-no 3 vezes para o prémio de Cannes. Não ganhou em nenhum caso. O «site» do IMDB comenta que «ainda hoje os fãs e os críticos não conseguem compreender como isto aconteceu».

Uns dizem que foi por Alfred Hitchcock ser católico. Outros, ao contrário, têm o cuidado de explicar que Hitchcock tinha deixado de ser católico. Um dos biógrafos, Donald Spoto, escreveu que Hitchcock «nunca autorizou um padre a entrar lá em casa, para o visitar ou para celebrar uma Missa sossegada, privadamente». Por isso, foi curioso ler na edição de 7 de Dezembro passado do «The Wall Street Journal» (página A-15 da versão americana) o artigo «Alfred Hitchcock's Surprise Ending» (o surpreendente final de Alfred Hitchcok), escrito por Mark Henninger, um padre jesuíta que hoje é professor na Universidade de Georgetown.

Henninger conta que o padre Tom Sullivan lhe pediu que o acompanhasse no sábado a casa de Hitchcock. Na sexta-feira ia lá confessá-lo e no sábado ia celebrar-lhe a Missa. Henninger, recém-ordenado, ainda estudante na universidade, não esperava visitar um personagem tão famoso. No sábado, quando chegaram, Hitchcock dormitava na sala de estar. O padre Sullivan acordou-o e fez as apresentações: «Hitch, este é o Mark Henninger, um padre recém-ordenado, de Cleveland». «Cleveland?!, ― comentou Hitchcock que desgraça!». Ficaram um bocado a conversar e depois foram para o escritório, onde celebraram Missa para Hitchcock e para a mulher. O padre Henninger distraía-se com aquelas estantes com os «dossiers» de tantos filmes que ficaram na história, mas o espectáculo mais impressionante foi Hitchcock a chorar, depois da Comunhão. Silenciosamente, com as lágrimas escorrendo pelas bochechas volumosas.


 O padre Sullivan e o padre Henninger voltaram lá mais vezes, sempre ao sábado, algumas vezes os dois, outras só um deles. No artigo, o Henninger recorda com mais pormenor uma dessas vezes em que foi sozinho e esteve a conversar na sala com Hitchcock, até que a certa altura o velho realizador se levantou: «vamos para a Missa». Tinha 81 anos e movia-se com dificuldade pelas galerias da casa. O relato da cena é encantador. Mas o que mais marcava Henninger era aquela reacção extraordinária, profundamente humana, de Hitchcock, quando chegava o momento de comungar.

Aquela era a sua verdadeira grandeza, longe do brilho dos holofotes. Tão diferente do que o representam alguns filmes recentes e alguns biógrafos.»


Maria Zarco
(a  preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)
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 (1) Aproveitando a Feira do Livro, aqui fica a referência bibliográfica completa: «ONDE HÁ CRISE, HÁ ESPERANÇA: Um pensamento por dia: ver em tudo o que acontece uma oportunidade de crescimento», Vasco P. Magalhães, sj, www.tenacitas.pt,
http://www.facebook.com/edicoes.tenacitas
 (2) Publicado no «Correio dos Açores», em Maio. 

2 comentários:

Anónimo disse...

O que Sophia diz do Porto, digo eu, ipsis verbis, de Lisboa. Bjs, pcp

Anónimo disse...

Magníficos os comentários sobre o Porto. Magnífico tudo o que o Pe Vasco Pinto de Magalhães pensa. Bjs. pcp

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