Há reflexões espantosas, que
nos ajudam a ver a realidade com outros olhos! Aguçam-nos e purificam-nos o
olhar. Coleccionei um par delas para ganharmos fôlego, neste mês de Junho, em
que o Verão começa a despontar e as férias se aproximam...
RASGAR O HORIZONTE DO AMOR
Para saber qual é o motor
de ignição do amor, as crianças e os poetas são dos melhores mestres para uma
resposta rápida, out of the box e
muito certeira. Assim, aqui vai a observação de um poeta, jesuíta (Vasco Pinto
Magalhães, SJ), que tem a coragem de focar sempre o lado luminoso da vida, como
espelha o título de um dos seus livros: «Onde há crise, há esperança»(1):
«A primeira
característica do amor é a inteligência. Se o amor não é inteligente, não é
humano e até nem sequer é amor! Amor é compreender o outro, dar-lhe o lugar
certo, ir ao encontro das suas necessidades e dar-lhe equilibradamente o que
ele precisa e eu lhe posso dar. Ora isso só se faz com inteligência, com uma
sensibilidade que sabe discernir. Inteligência
quer dizer "ler por dentro" a realidade. Posse e prazer são uma
caricatura do amor. Entregar-se e acolher inteligentemente é próprio de quem
ama. Aqui o grande modelo é Cristo.»
Bom, e se adensarmos a reflexão e arriscarmos
falar de felicidade, acreditando (eis o busílis da questão:) que é possível ser
feliz?
«Um grande
filósofo, escrevendo sobre o amor e a
felicidade, disse que a união
diferencia! Sim, não só a união se enriquece com as diferenças, pois a
comunhão não é confusão nem somatório (e dois iguais nada de novo acrescentam),
como a comunhão esclarece e purifica as
diferenças, pois faz apurar e clarificar o papel de cada um na sua
complementaridade. O igualitarismo, de etnia, de sexo, de cultura ou de
religião, tem como consequência um mundo e uma humanidade empobrecidos.»
O PORTO NA MIRA DE ARTISTAS NACIONAIS
Uma resenha engraçada de
citações de escritores portugueses foi reunida há um par de anos, incidindo
sobre a cidade Invicta, que o actor John Malkovitch considera a cidade mais
romântica do mundo.
«Toda a cidade, com as
agulhas dos templos, as torres cinzentas, os pátios e os muros em que se cavam
escadas, varandas com os seus restos de tapetes de quarto dependurados e o
estripado dos seus interiores ao sol fresco, tem toda ela uma forma, uma alma
de muralha.»
Agustina Bessa Luís
«Se na nossa cidade há
muito quem troque o b por v, há quem pouco troque a liberdade pela servidão.»
Almeida
Garret
«Uma ida ao Porto é
sempre uma lição de portuguesismo, tanto mais rica quanto mais raramente lá se
vai. É indispensável – claro! – um mínimo de contacto reiterado com esse lar da
nação para nele vermos algumas das significações latentes que enriquecem a
nossa consciência de práticas.»
Vitorino
Nemésio
«Lisboa inveja ao Porto a sua riqueza, o seu comércio, as suas belas ruas novas, o conforto das suas casas, a solidez das suas fortunas, a seriedade do seu bem estar. O Porto inveja a Lisboa a Corte, o Rei, as Câmaras, S.Carlos e o Martinho. Detestam-se!»
Eça
de Queiroz
«O Porto não é em rigor
uma cidade: é uma família. Quando algum mal acomete, todos o sentem com a mesma
intensidade; quando desejam alguma coisa, todos a desejam ao mesmo tempo. Os
portuenses são tão ciosos da integridade da sua cidade, como os portugueses em
geral na integridade da nação.»
João
Chagas
«O Porto ergue-se em anfiteatro sobre o esteiro do Douro e reclina-se no seu leito de granito. Guardador de três províncias e tendo nas mãos as chaves dos haveres delas, o seu aspecto é severo e altivo, como o de mordomo de casa abastada.»
Alexandre Herculano
«Afinal, o Porto, para
verdadeiramente honrar o nome que tem, é, primeiro que tudo, este largo regaço
aberto para o rio, mas que só do rio se vê, ou então, por estreitas bocas
fechadas por muretes, pode o viajante debruçar-se para o ar livre e ter a ilusão
de que todo o Porto é a Ribeira.»
José
Saramago
«O portuense não gosta de
Lisboa. Não gosta da polícia. Não gosta da autoridade. Da autoridade vingam-se,
desprezando-a. Da polícia vinga-se resistindo-lhe. De Lisboa vinga-se,
recebendo os lisboetas com a mais amável hospitalidade e com a mais obsequiada
bizarria.»
Ramalho
Ortigão
«E quanto ao riso, o Porto gosta de rir com uma certa insolência: ri mais desbragadamente, mais primariamente, mais saudavelmente e com mais gosto do que Lisboa.»
Vasco Graça Moura
«O Porto é o lugar onde para mim começam as
maravilhas e todas as angústias»
Sophia de Mello Breyner
Sophia de Mello Breyner
HITCHCOCK VISTO NA INTIMIDADE –
SURPREENDENTE
Num artigo(2), gentilmente
cedido pelo autor (da família), José Maria André desvenda uma faceta
desconhecida e imprevisível do grande realizador norte-americano!
«Suspense»! Meandros secretos do cinema
O tema de hoje é
Alfred Hitchcok, pai do «suspense», recordando o aniversário da sua morte,
ocorrido há dias. (…)
O mundo inteiro
ouviu falar de Hitchcock. Realizou mais de meia centena de filmes, que geraram
um entusiasmo extraordinário e foram sucessos de bilheteira. O êxito foi de tal
forma, que os dicionários de inglês têm a palavra «Hitchcockian», para designar
filmes emocionantes. A cada filme, surgia a pergunta: será desta, que ele
recebe o seu primeiro Oscar? A pergunta repetiu-se todos os anos, ao longo de
sessenta anos de carreira brilhante. O Oscar nunca chegou.
Foi proposto 5 vezes
para o Oscar de melhor realizador, propuseram-no 6 vezes para o prémio da DGA
(«Directors Guild of America»), propuseram-no 3 vezes para o prémio de Cannes.
Não ganhou em nenhum caso. O «site» do IMDB comenta que «ainda hoje os fãs e os
críticos não conseguem compreender como isto aconteceu».
Uns dizem que foi
por Alfred Hitchcock ser católico. Outros, ao contrário, têm o cuidado de
explicar que Hitchcock tinha deixado de ser católico. Um dos biógrafos, Donald
Spoto, escreveu que Hitchcock «nunca autorizou um padre a entrar lá em casa,
para o visitar ou para celebrar uma Missa sossegada, privadamente». Por isso,
foi curioso ler na edição de 7 de Dezembro passado do «The Wall Street Journal»
(página A-15 da versão americana) o artigo «Alfred Hitchcock's Surprise Ending»
(o surpreendente final de Alfred Hitchcok), escrito por Mark Henninger, um
padre jesuíta que hoje é professor na Universidade de Georgetown.
Henninger conta que
o padre Tom Sullivan lhe pediu que o acompanhasse no sábado a casa de
Hitchcock. Na sexta-feira ia lá confessá-lo e no sábado ia celebrar-lhe a
Missa. Henninger, recém-ordenado, ainda estudante na universidade, não esperava
visitar um personagem tão famoso. No sábado, quando chegaram, Hitchcock
dormitava na sala de estar. O padre Sullivan acordou-o e fez as apresentações:
«Hitch, este é o Mark Henninger, um padre recém-ordenado, de Cleveland».
«Cleveland?!, ― comentou Hitchcock ― que desgraça!». Ficaram um bocado a
conversar e depois foram para o escritório, onde celebraram Missa para
Hitchcock e para a mulher. O padre Henninger distraía-se com aquelas estantes
com os «dossiers» de tantos filmes que ficaram na história, mas o espectáculo
mais impressionante foi Hitchcock a chorar, depois da Comunhão.
Silenciosamente, com as lágrimas escorrendo pelas bochechas volumosas.
O padre Sullivan e o
padre Henninger voltaram lá mais vezes, sempre ao sábado, algumas vezes os
dois, outras só um deles. No artigo, o Henninger recorda com mais pormenor uma
dessas vezes em que foi sozinho e esteve a conversar na sala com Hitchcock, até
que a certa altura o velho realizador se levantou: «vamos para a Missa». Tinha
81 anos e movia-se com dificuldade pelas galerias da casa. O relato da cena é
encantador. Mas o que mais marcava Henninger era aquela reacção extraordinária,
profundamente humana, de Hitchcock, quando chegava o momento de comungar.
Aquela era a sua
verdadeira grandeza, longe do brilho dos holofotes. Tão diferente do que o
representam alguns filmes recentes e alguns biógrafos.»
Maria Zarco
(a preparar o próximo gin tónico,
para daqui a 2 semanas)
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(1) Aproveitando a Feira do Livro, aqui fica
a referência bibliográfica completa: «ONDE HÁ CRISE, HÁ ESPERANÇA: Um pensamento por dia: ver em tudo o que
acontece uma oportunidade de crescimento», Vasco P. Magalhães, sj, www.tenacitas.pt,
http://www.facebook.com/edicoes.tenacitas
(2) Publicado no «Correio
dos Açores», em Maio.
2 comentários:
O que Sophia diz do Porto, digo eu, ipsis verbis, de Lisboa. Bjs, pcp
Magníficos os comentários sobre o Porto. Magnífico tudo o que o Pe Vasco Pinto de Magalhães pensa. Bjs. pcp
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