03 setembro 2015

Sei lá...

Numa das minhas rondas de blogues encontro este início de parágrafo: "O Pátio das Cantigas" de Leonel Vieira é o filme português com o maior sucesso de bilheteira de todos os tempos. Porém, de acordo com os críticos, o seu destino não deveria ser uma sala de cinema mas o cano de esgoto." Nos parágrafos seguintes faz-se a defesa do filme, não enquanto obra cinematográfica, mas como momento de entretenimento. E diz o autor que a ninguém de bom senso lhe passa pela cabeça achar que uma sinfonia de Mahler não é superior a uma música pimba, mas não é por isso que se deve condenar esta última ao forno incinerador.

Não vi esta versão do Pátio das Cantigas mas, pelo que me têm dito, é entretenimento puro - toda a gente dá por bem empregue o dinheiro e o tempo gastos apesar de dizerem que não é um grande filme. É, em parte um bom indicador para o cinema português. Nesta senda dos filmes portugueses este domingo, talvez, vi na RTP 1 o filme "Sei Lá", baseado num livro de Margarida Rebelo Pinto, curiosamente o único que li dela - e de que não gostei. Não sou cinéfilo, pelo que me pronuncio muito com base no gostei / não gostei. Sinceramente, e usando a expressão do primeiro parágrafo, tudo aquilo deveria ter como destino o cano de esgoto, salvo uma ou outra interpretação. 



Consegue fazer-se um bom filme de um mau livro? Não sei. Admito que haja exemplos, eu não os conheço, mas nesta arte sou ignorante. É verdade que não sou da geração dos protagonistas (penso que por volta dos 30 anos) mas, por aquilo que vou ouvindo, não me parece que uma certa sociedade (que dá um beijinho apenas e tem nomes considerados tradicionais, ou que usem "você" ao falarem com o outro sexo) abusem uma liberdade de linguagem que faz corar um carroceiro, façam colecção de homens de uma noite só, vivam uma vida triste de abandono afectivo. A ideia de serviços secretos representada por aqueles dois actores é motivo de vergonha para as nossas secretas. A festa da revista, supostamente frequentada pelo jet set, é um carnaval - há casacas, há smokings, há casacos e gravatas. Não percebi, usando uma ideia do Eça, porque não havia ninguém de urso ou de tirolesa.

A ideia de suspensão da incredulidade tem 200 anos: havendo um interesse humano e uma semelhança com a verdade num conto fantástico, o leitor ignoraria a implausibilidade da narrativa. Nem com esta ideia se vai lá. Nada daquilo tem o menor interesse, a menor verosimilhança - personagens ocos, diálogos fracos, história ainda menos. Eu, confesso, não consegui suspender a minha incredulidade, e por isso me mantive espantado do princípio ao fim quando um perigoso bombista da ETa se mantém inalterado e quieto enquanto a ex-namorada e o agente secreto se escapulem na direcção da noite. O mundo não é um lugar seguro.

Nota: não vi o excerto que aqui posto. Não garanto a educação da linguagem...

JdB 

1 comentário:

Anónimo disse...

Nunca li a senhora em questão, mas, curiosamente, também espreitei o filme, na ressaca do regresso de férias.

Dei por mim a pensar que há mais proximidade entre mim e alguns dos nossos semelhantes que viveram no século XIX do que entre mim e alguma da realidade retratada no filme / no livro (acreditando que é uma adaptação mais ou menos fidedigna).

Não vale a pena negar o tempo em que vivemos. Mas podemos - e devemos - ter sobre ele opinião, até para que o nosso modo de vida possa ser mais de acordo com o que somos e menos com o ar do tempo e a espuma dos dias.

E eis como um improvável "sei lá" nos oferece "coisas" para dizer.

Um abraço,


gi.

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