O "ato gratuito" é um gesto que nos salva.
Uma das mais belas orações que conheço foi aquela encontrada entre os pertences
pessoais de um judeu, morto num campo de concentração. Diz o seguinte: «Senhor,
quando vieres na Tua glória, não Te lembres somente dos homens de boa vontade;
lembra-Te também dos homens de má vontade. E, no dia do Julgamento, não Te
lembres apenas das crueldades e violências que eles praticaram: lembra-Te também
dos frutos que produzimos por causa daquilo que eles nos fizeram. Lembra-Te da
paciência, da coragem, da confraternização, da humildade, da grandeza de alma e
da fidelidade que os nossos carrascos acabaram por despertar em cada um de nós.
Permite então, Senhor, que os frutos em nós despertados possam servir
também para salvar esses homens».
Recebi este texto do Padre Tolentino Mendonça (que
vale a pena ser lido na totalidade aqui) no remanso do Castelo de
Bode, com uma vista deslumbrante sobre a vastidão da barragem e com um silêncio
entrecortado, apenas, pelas conversas e pelo ruído longínquo de um ou outro
barco a motor. Há muito que acho o silêncio reconfortante e propício, não a
neuroses, mas a introspecções ou laboração de ideias.
A oração de que fala o Padre Tolentino é
particularmente bonita e tocante. Fala de perdão - que força interior tem de
ter quem quer perdoar o carrasco! - e revela a capacidade do autor em olhar
além do desfocado, das coisas óbvias e imediatas. Somos o que somos e a nossa
circunstância. Mas também somos o que os outros fazem da nossa pessoa. O bem
que há dentro de nós e que fazem ressaltar, mas também o desafio de sermos bons
perante a maldade.
Temos todos muito (vou eu presumir) para agradecer aos
outros. Às vezes é bom lembrarmo-nos disto, mesmo que não consigamos verbalizar
o agradecimento. Eu, pessoalmente, teria um ror de gente a quem dizer obrigado:
gente que permitiu ou lutou para que viessem ao de cima as qualidades que
tenho; gente que me ouviu pacientemente nos tempos difíceis e que nunca faltou
com uma palavra de sossego ou de confiança; gente que leu, tantas e tantas
vezes, aquilo que eu tinha a dizer a mim próprio; gente que me fez perceber
que somos mais, mas muito mais, do que a evidência mais básica dos nossos
comportamentos; gente que me disse o que eu não queria, mas que precisava
de ouvir; gente que me disse não, mas ofereceu um abraço de compaixão;
gente que...
Bom Domingo para todos.
JdB
***
EVANGELHO – Jo 6,51-58
Evangelho de Nosso Senhor
Jesus Cristo segundo São João
Naquele tempo,
disse Jesus à multidão:
«Eu sou o pão vivo que
desceu do Céu.
Quem comer deste pão
viverá eternamente.
E o pão que Eu hei-de dar
é minha carne,
que Eu darei pela vida do
mundo».
Os judeus discutiam entre
si:
«Como pode ele dar-nos a
sua carne a comer?»
E Jesus disse-lhes:
«Em verdade, em verdade
vos digo:
Se não comerdes a carne
do Filho do homem
e não beberdes o seu
sangue,
não tereis a vida em vós.
Quem come a minha carne e
bebe o meu sangue
tem a vida eterna;
e Eu o ressuscitarei no
último dia.
A minha carne é
verdadeira comida
e o meu sangue é
verdadeira bebida.
Quem come a minha carne e
bebe o meu sangue
permanece em Mim e eu
nele.
Assim como o Pai, que
vive, Me enviou
e eu vivo pelo Pai,
também aquele que Me come
viverá por Mim.
Este é o pão que desceu
do Céu;
não é como o dos vossos
pais, que o comeram e morreram:
quem comer deste pão viverá
eternamente».
1 comentário:
Obrigada João pelo texto lindo do p Tolentino e sobretudo pelas suas meditações.
Beijinhos
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