O buraco da agulha
É certamente uma anedota a história do rico industrial alemão (curioso, mas deve ser coincidência!) que mandou fazer, numa das suas fábricas, uma agulha com um buraco suficientemente grande, para passar por ele o dito camelo das palavras de Jesus no evangelho! Mas é concerteza desse tamanho o buraco que se cria nas consciências de nós, cristãos, quando, em lugares onde possamos ganhar exageradamente (ou até indignamente, se olhássemos bem em volta!), juntamos a fé e o dinheiro numa aliança admirável! A honestidade do homem rico do evangelho, que percebeu não poder seguir Jesus e continuar a adorar os seus bens, ao menos, é autêntica.
Na perspectiva da Bíblia as riquezas são uma bênção de Deus. Atrevo-me a dizer que o desejo de Deus é que todos sejamos ricos. Mas ricos de quê? Simplesmente de coisas que se acumulam e guardam, que precisam de cofres e guardas, e encerram em gaiolas douradas os seus donos? Grande é a embriaguez do possuir, que parece transformar em semi-deuses quem é tão de carne como o mais desventurado dos homens! Como se transforma o dono em escravo de bens e caprichos, prazeres e luxos, seus e dos que parasitam à sua volta? Como se adaptam os valores mais nobres da justiça e do bem comum, e até crenças ou ritos religiosos, a vidas de compromissos dúbios, de esquemas e corrupções para se ganhar mais? As riquezas são dom de Deus, mas os ricos, voltados para si e para a desmesura dos seus apetites, são objecto da indignação dos profetas. Como entrar no reino de Deus se nenhuma “tralha” podemos levar connosco?
A relação justa com os bens é um exercício de sabedoria. A Bíblia aponta a imagem do administrador, do colaborador de Deus na criação, como aquela que melhor serve ao homem. Sábio é quem põe os dons a render, mas encontra maior alegria em colocá-los de novo nas mãos de Deus do que em possuí-los. Em tempo de escassez de bens como o nosso (e, infelizmente, de um abissal distanciamento de ricos e pobres, de direitos e regalias inqualificáveis), a sabedoria é cada vez mais urgente. Sabedoria para escolher o essencial, para promover a inteligência no uso das coisas, para evitar o desperdício, para valorizar o trabalho, para não ceder à tentação do “salve-se quem puder”.
Entrámos no Ano da Fé e este domingo podemos perguntar: como colocamos Jesus no meio da nossa crise. Quem adoramos? Em que investimos as nossas forças e os nossos bens? Como refreamos a nossa ânsia de consumir e revemos a partilha e a entreajuda? Poderemos fazer gestos insignificantes para a economia mundial. Mas serão certamente um sinal. Porque seguir Jesus agarrado aos bens e continuando a “passar camelos” pelo buraco largo da consciência, pode dar um ar de “bons cristãos”, mas é, certamente, uma grande ilusão!
P. Vitor Gonçalves
Voz da Verdade 14.10.2012
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EVANGELHO – Mc 10,17-30
Evangelho de Nosso Senhor
Jesus Cristo segundo São Marcos
Naquele tempo,
ia Jesus pôr-Se a
caminho,
quando um homem se
aproximou correndo,
ajoelhou diante d’Ele e
Lhe perguntou:
«Bom Mestre, que hei-de
fazer para alcançar a vida eterna?»
Jesus respondeu:
«Porque me chamas bom?
Ninguém é bom senão Deus.
Tu sabes os mandamentos:
‘Não mates; não cometas
adultério;
não roubes; não levantes
falso testemunho;
não cometas fraudes; honra pai e mãe’».
O homem disse a Jesus:
«Mestre, tudo isso tenho
eu cumprido desde a juventude».
Jesus olhou para ele com
simpatia e respondeu:
«Falta-te uma coisa: vai
vender o que tens,
dá o dinheiro aos pobres,
e terás um tesouro no Céu.
Depois, vem e segue-Me».
Ouvindo
estas palavras, anuviou-se-lhe o semblante
e retirou-se pesaroso,
porque era muito rico.
Então Jesus, olhando à
volta, disse aos discípulos:
«Como será difícil para
os que têm riquezas
entrar no reino de Deus!»
Os discípulos ficaram
admirados com estas palavras.
Mas Jesus afirmou-lhes de
novo:
«Meus filhos, como é difícil
entrar no reino de Deus!
É mais fácil passar um
camelo pelo fundo de uma agulha
do que um rico entrar no
reino de Deus».
Eles admiraram-se ainda
mais e diziam uns aos outros:
«Quem pode então
salvar-se?»
Fitando neles os olhos,
Jesus respondeu:
«Aos homens é impossível,
mas não a Deus,
porque a Deus tudo é
possível».
Pedro começou a
dizer-Lhe:
«Vê como nós deixámos
tudo para Te seguir».
Jesus respondeu:
«Em verdade vos digo:
Todo aquele que tenha
deixado casa,
irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos ou terras,
por minha causa e por
causa do Evangelho,
receberá cem vezes mais,
já neste mundo,
em casas, irmãos, irmãs,
mães, filhos e terras,
juntamente com
perseguições,
e, no mundo futuro, a
vida eterna».
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