É conhecida a resposta (de que refiro parte) que Churchill terá dado quando lhe perguntaram o segredo para a sua longevidade: conservação da energia; não faça sentado o que pode fazer deitado, não faça em pé o que possa fazer sentado.
Devo confessar que sigo esta máxima churchilliana com gosto; sou comodista (a distância à preguiça pode ser um fio de cabelo) e arreigou-se-me esta ideia de que já não vale a pena esgotar a cabeça para perceber algumas coisas que utilizarei pouco no futuro. Assim, quando não sei pergunto, e na resposta que me dão - ou na resolução do problema que me apresentam - aprendo alguma coisa. Há quem ache que o GPS é um dispositivo errado, porque nos impede de pensar em termos de geografia. Eu, dada a minha proverbial falta de sentido de orientação, acho o GPS uma invenção de importância muito superior ao Raio X ou ao antibiótico; e entendo que o aparelho me mostra alternativas de circulação que eu não conhecia.
Em tempos de quarentena a conservação da energia pode ser uma ferramenta mental preciosa; não sabemos o que vai passar-se, se a quarentena acaba no final de Abril, de Maio, de Junho ou de 2020. Ninguém sabe como fica o país - menos ainda o mundo - com dois meses de quarentena. Não me preocupa que as crianças ou os jovens percam o ano e que com isso atrasem a sua vida escolar; no fecho das escolas preocupa-me, isso sim, a quantidade de crianças enfiadas em casas por vezes exíguas sem nada de novo para fazer. Preocupa-me a sanidade mental dos pais, retidos em apartamentos pequenos com filhos energéticos, a precisarem de rua, de brincadeiras, de sujar as mãos ou de puxar os cabelos de alguém.
Sou da opinião que o governo / autoridades de saúde deviam dar um horizonte temporal para esta quarentena cívica. Falei com duas pessoas (por acaso duas mulheres) que acharam exactamente o contrário: que não, que isso é criar uma expectativa perniciosa às pessoas. Vivo numa casa grande, com uma pessoa apenas e um cão. Há 13 anos que vivo em regime de teletrabalho, com o qual me dou como Deus e os anjos. Eu serei uma excepção, e só não tive de aplicar a minha versão de conservação de energia porque já sou assim por natureza: organizado, planeado, com uma visão muito parcimoniosa da actividade que não acrescenta valor, a não ser (ainda que raramente) não fazer nada, que é uma actividade que acrescenta muito valor.
São tempos que requerem uma gestão cuidadosa da energia. Como dizia alguém, somos roubados, violados, vilipendiados e, mesmo assim, aguentamos. Mas é o atacador que se parte na altura errada que nos leva à maior loucura.
JdB
5 comentários:
(...) mesmo aquilo que reputo como actividades importantes tais como “não fazer nada” e “manter o cérebro quieto”.
Escrevi em 2006. E como disse o outro: Quod scripsi, scripsi.
Abraço,
ao
Na minha saloiice, nenhum atacador se parte na altura certa. Assim, aleatóriamente, no dia-a-dia, mudo o local de maior pressão nos meus atacadores. Passam a ter os predicados das pilhas: duram, duram.
Se bem que seja 'caseiro', acho que ando a escrever tonteiras mesmo sem CoViD.
Abraço,
ao
Conservar energia para uns, gastar energias para outros. "Always perspective" e gosto sempre de o ler.
Tenho dúvidas quanto ao horizonte temporal e entendo perfeitamente a questão.
Os ocidentais (europeus e americanos) dão imenso valor ao tempo. Quanto tempo tens, a que horas chegas, a que horas saímos, tempo que determina o sucesso dos nossos empreendimentos.
Em África o tempo é uma constante, é algo que existe, apenas. Aindaaaaaaa, quer dizer que será feito, mas não tem horizonte temporal, porque sentir o que se faz é mais importante. No oriente o tempo é intemporal e quem vier depois, vai continuar a ter tempo.
Churchill deixava The Cabinet of War Rooms onde tinha o seu quarto
https://mapadelondres.org/wp-content/uploads/2011/04/IMG_9949x1.jpg
no meio de bombardeamentos e apesar do receio dos que com ele trabalhavam, para ir dormir na cama de sua própria casa, que preferia.
Bombardeamentos? Paciência... É preciso repor energia.
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