Marguerite Yourcenar, in "Sistina"
As melhores viagens são, por vezes, aquelas em que partimos ontem e regressamos muitos anos antes
31 agosto 2009
Pensamentos dos dias que correm
Marguerite Yourcenar, in "Sistina"
30 agosto 2009
Poema para um Domingo
Uns, com os olhos postos no passado,
Vêem o que não vêem: outros, fitos
Os mesmos olhos no futuro, vêem
O que não pode ver-se.
Por que tão longe ir pôr o que está perto —
A segurança nossa? Este é o dia,
Esta é a hora, este o momento, isto
É quem somos, e é tudo.
Perene flui a interminável hora
Que nos confessa nulos. No mesmo hausto
Em que vivemos, morreremos. Colhe
O dia, porque és ele.
Ricardo Reis, in "Odes"
XXII Domingo do Tempo Comum
Naquele tempo,
reuniu-se à volta de Jesus
um grupo de fariseus e alguns escribas
que tinham vindo de Jerusalém.
Viram que alguns dos discípulos de Jesus
comiam com as mãos impuras, isto é, sem as lavar.
– Na verdade, os fariseus e os judeus em geral
não comem sem terem lavado cuidadosamente as mãos,
conforme a tradição dos antigos.
Ao voltarem da praça pública,
não comem sem antes se terem lavado.
E seguem muitos outros costumes
a que se prenderam por tradição,
como lavar os copos, os jarros e as vasilhas de cobre –.
Os fariseus e os escribas perguntaram a Jesus:
«Porque não seguem os teus discípulos a tradição dos antigos,
e comem sem lavar as mãos?»
Jesus respondeu-lhes:
«Bem profetizou Isaías a respeito de vós, hipócritas,
como está escrito:
‘Este povo honra-Me com os lábios,
mas o seu coração está longe de Mim.
É vão o culto que Me prestam,
e as doutrinas que ensinam não passam de preceitos humanos’.
Vós deixais de lado o mandamento de Deus,
para vos prenderdes à tradição dos homens».
Depois, Jesus chamou de novo a Si a multidão
e começou a dizer-lhe:
«Ouvi-Me e procurai compreender.
Não há nada fora do homem
que ao entrar nele o possa tornar impuro.
O que sai do homem é que o torna impuro;
porque do interior dos homens é que saem os maus pensamentos:
imoralidades, roubos, assassínios,
adultérios, cobiças, injustiças,
fraudes, devassidão, inveja,
difamação, orgulho, insensatez.
Todos estes vícios saem lá de dentro
e tornam o homem impuro».
29 agosto 2009
28 agosto 2009
Músicas dos dias que correm
Porque há jantares particularmente divertidos, interessantes e de aprendizagem permanente. Les beaux esprits se rencontrent.
jeanne moreau
quase que me apaixonei por ti, jeanne,
como é timbre dos adolescentes em qualquer lugar.
no tempo em que barcos sedentos se lançavam ao mar,
eras a mulher-fatal, negra e perfeita,
inventada por marinheiro qu'em terra só queria navegar.
no tempo dessas manhãs-sem-igual-belas-de-pasmar,
esperava-te à porta de todos os sonhos.
e tu chegavas e tu eras minha..
(diz-me, jeanne, devagarinho:
chegaste mesmo a chegar?)
gi
27 agosto 2009
In memoriam de Londres, 2006
do teu sereno olhar, do teu sorriso,
da tua mão pousada no meu ombro.
E ouvir-te murmurar: espera e confia.
E sentir converter-se em harmonia
o que era, antes, confusão e assombro."
Carlos Queirós
(Nota: Por sugestão de PCP, bloguista frequente neste Adeus..., que escolheu o título do post e o poema)
26 agosto 2009
Poemas dos dias que correm
Tenho uma grande constipação,
E toda a gente sabe como as grandes constipações
Alteram todo o sistema do universo,
Zangam-nos contra a vida,
E fazem espirrar até à metafísica.
Tenho o dia perdido cheio de me assoar.
Dói-me a cabeça indistintamente.
Triste condição para um poeta menor!
Hoje sou verdadeiramente um poeta menor.
O que fui outrora foi um desejo; partiu-se.
Adeus para sempre, rainha das fadas!
As tuas asas eram de sol, e eu cá vou andando.
Não estarei bem se não me deitar na cama.
Nunca estive bem senão deitando-me no universo.
Excusez un peu... Que grande constipação física!
Preciso de verdade e da aspirina.
Álvaro de Campos, in "Poemas"
25 agosto 2009
Poemas dos dias que correm
Escuto na palavra a festa do silêncio.
Tudo está no seu sítio. As aparências apagaram-se.
As coisas vacilam tão próximas de si mesmas.
Concentram-se, dilatam-se as ondas silenciosas.
É o vazio ou o cimo? É um pomar de espuma.
Uma criança brinca nas dunas, o tempo acaricia,
o ar prolonga. A brancura é o caminho.
Surpresa e não surpresa: a simples respiração.
Relações, variações, nada mais. Nada se cria.
Vamos e vimos. Algo inunda, incendeia, recomeça.
Nada é inacessível no silêncio ou no poema.
É aqui a abóbada transparente, o vento principia.
No centro do dia há uma fonte de água clara.
Se digo árvore a árvore em mim respira.
Vivo na delícia nua da inocência aberta.
António Ramos Rosa, in "Volante Verde"
24 agosto 2009
Pensamentos dos dias que correm
23 agosto 2009
Fé
Subam eternamente aos teus ouvidos;
Eternamente aos teus ouvidos soem
Os cânticos da terra.
No turvo mar da vida,
Onde aos parcéis do crime a alma naufraga,
A derradeira bússola nos seja,
Senhor, tua palavra.
A melhor segurança
Da nossa íntima paz, Senhor, é esta;
Esta a luz que há de abrir à estância eterna
O fulgido caminho.
Ah ! feliz o que pode,
No extremo adeus às cousas deste mundo,
Quando a alma, despida de vaidade,
Vê quanto vale a terra;
Quando das glórias frias
Que o tempo dá e o mesmo tempo some,
Despida já, — os olhos moribundos
Volta às eternas glórias;
Feliz o que nos lábios,
No coração, na mente põe teu nome,
E só por ele cuida entrar cantando
No seio do infinito.
Machado de Assis, in 'Crisálidas'
XXI Domingo do Tempo Comum
Naquele tempo,
muitos discípulos, ao ouvirem Jesus, disseram:
«Estas palavras são duras.
Quem pode escutá-las?»
Jesus, conhecendo interiormente
que os discípulos murmuravam por causa disso,
perguntou-lhes:
«Isto escandaliza-vos?
E se virdes o Filho do homem
subir para onde estava anteriormente?
O espírito é que dá vida,
a carne não serve de nada.
As palavras que Eu vos disse são espírito e vida.
Mas, entre vós, há alguns que não acreditam».
Na verdade, Jesus bem sabia, desde o início,
quais eram os que não acreditavam
e quem era aquele que O havia de entregar.
E acrescentou:
«Por isso é que vos disse:
Ninguém pode vir a Mim,
se não lhe for concedido por meu Pai».
A partir de então, muitos dos discípulos afastaram-se
e já não andavam com Ele.
Jesus disse aos Doze:
«Também vós quereis ir embora?»
Respondeu-Lhe Simão Pedro:
«Para quem iremos, Senhor?
Tu tens palavras de vida eterna.
Nós acreditamos
e sabemos que Tu és o Santo de Deus».
22 agosto 2009
Pensamentos dos dias que correm
Eça de Queirós, in 'A Correspondência de Fradique Mendes'
21 agosto 2009
da geografia interior
a cidade mágica para trás,
a teu lado o companheiro de sempre,
ângulo generoso e terceiro
dessa figura geométrica que a amizade
pode, em dias largos, ser.
o teu amigo fez quarenta anos,
o que, feitas as contas por alto,
dá a esse nobre triângulo a três
uns trinta anitos - sobressalto.
o tempo passa, sempre o soubeste,
mas era mais, como dizer, em abstracto.
ver os quarenta anos de um amigo
faz de matéria vaga matéria de facto.
que fazes dos teus dias, rapaz?
que segredos deixarás aos vindouros?
o zénite está já a teus pés, foge-te,
as horas escasseiam, faltam, doem-te.
estes teriam sido os anos de ouro,
fosses tu outro. ou mais tu
- mas mais capaz.
gi
20 agosto 2009
19 agosto 2009
O Barqueiro e o Erudito
- Podes passar-me para a outra margem?
- Sim, claro, são duas rupias.
E o letrado temendo sujar-se ao tocar o barqueiro, entregou-lhe essas moedas.
Quando já estavam a atravessar o rio, e enquanto o barqueiro fazia o seu trabalho, o erudito perguntou:
- Barqueiro, estudaste Sânscrito? A língua em que, sabes, foram escritos os Vedas, os Upanishads, as epopeias do Mahabharata e o Ramayana, todos os Puranas e Upapuranas, a língua de Valmiki e Vyasa, a língua em que foi escrito o glorioso Bhagavad Gita, resumo de todo o conhecimento?
- Não senhor, nada sei de dita língua
- Oh, que desperdício de vida, então nada te posso dizer da beleza de suas estruturas sintácticas, dessas formas sublimes analisadas pelo ilustre Patanjali.
- E sabes, por acaso, Latim? A língua de Virgílio e de Cícero, tão belamente sonora e rítmica, como dizia em seus discursos o grande pretor romano, Quo usque abutere patientia nostra, que significa “Até quando abusarás da nossa paciência”? Oh, Oh, perdeste sem nenhuma dúvida metade da tua vida inutilmente.
- Não senhor, disso também não sei nada.
- Oh que tristeza de vida, então também não terás lido os versos amorosos de Ovídeo e Catulo, ou as tragédias de Séneca. Oh, Oh, Oh, perdeste sem duvida metade da tua vida.
E conheces os mistérios da Geometria?, que permite medir as distancias e as superfícies, classificar os ângulos, reconhecer os tipos de triângulos e fundamentar o cálculo diferencial para, claro poder estudar a Dinâmica dos Fluidos, tão necessário num trabalho como o teu?
- Oh, senhor, nada sei de Geometria
- Bem, bem, bem, oh, vida miserável e arruinada, perdeste metade da tua vida.
E Aritmética?, para distinguir os números racionais, os transcendentes, os imaginários?; sabes que Pi, o número que resulta da divisão da circunferência pelo diâmetro é um numero transcendente, tal como o número que permite calcular a forma de uma Ciclóide, que é como a forma que assume esta corda estendida na tua barca?
- Não, não, nada sei de Aritmética
Nisto as águas do rio começaram a agitar-se, movidas por uma tempestade, que de repente e com surpreendente violência começou a agitar a barca. Porem o erudito estava tão possuído de seus conhecimentos e com tanta soberba para com o humilde barqueiro que não se apercebia. Repetia, perdeste metade da tua vida inutilmente. E continuava instigando o nosso barqueiro com perguntas com as quais demonstrava orgulhosamente o seu saber.
- Ah claro, e seguramente também não sabes nada de Metafísica, dos mistérios da ontologia e as categorias do Ser….
- Ah, desculpe, desculpe, senhor, e você sabe nadar?
- Eu, Eu, e porque me pergunta isso, eu não sei.
- Pois nesse caso, vai perder a sua vida inteira, porque esta barca afunda-se, afunda-se, afunda-se.
Mais importante que acumular conhecimentos é encontrar o sentido da vida, como um fio mágico que conduz a nossa existência. O grande sábio Pitágoras dizia que melhor que um tonel de conhecimento é uma gota de verdadeira sabedoria, e a sabedoria que já é a alma da vida, é quem nos pode orientar no meio das tempestades do mundo. A nossa vida é uma barca frágil, o barqueiro é a consciência.
O que é mais importante que chegar, a tempo e bem, ao porto sonhado, e não fundir-se nas enganosas águas do que não somos, não cedendo aos cantos de sereia do mundo? O mais importante de aprender é a Arte De Viver.
18 agosto 2009
Pensamentos dos dias que correm
Para a primeira categoria - doenças, privações, a morte de amigos ou filhos -, que parece acarretar naturalmente dor e vexação, esta linha de Eurípedes deve estar à mão: "Ai! por que ai? É o quinhão da mortalidade que nos coube". Nenhum outro argumento lógico pode romper de forma tão efectiva a espiral descendente das nossas emoções, do que a reflexão de que somente através da compulsão comum da Natureza, um dos elementos da sua constituição física, é que o homem se torna vulnerável à Fortuna; nos seus aspectos principais e essenciais, permanece seguro.
Plutarco, in 'Do Contentamento'
17 agosto 2009
Pensamentos dos dias que correm
Jean-Paul Sartre, in 'Situações I'
16 agosto 2009
XX Domingo do Tempo Comum
Evangelho segundo S. João 6,51-58.
«Eu sou o pão vivo, o que desceu do Céu:
se alguém comer deste pão, viverá eternamente;
e o pão que Eu hei-de dar é a minha carne, pela vida do mundo.»
Então, os judeus, exaltados, puseram-se a discutir entre si, dizendo:
«Como pode Ele dar-nos a sua carne a comer?!»
Disse-lhes Jesus:
«Em verdade, em verdade vos digo:
se não comerdes mesmo a carne do Filho do Homem
e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós.
Quem realmente come a minha carne
e bebe o meu sangue tem a vida eterna
e Eu hei-de ressuscitá-lo no último dia,
porque a minha carne é uma verdadeira comida
e o meu sangue, uma verdadeira bebida.
Quem realmente come a minha carne
e bebe o meu sangue fica a morar em mim e Eu nele.
Assim como o Pai que me enviou vive
e Eu vivo pelo Pai, também quem de verdade me come viverá por mim.
Este é o pão que desceu do Céu;
não é como aquele que os antepassados comeram,
pois eles morreram;
quem come mesmo deste pão viverá eternamente.»
Desejar ser
Padre António Vieira
15 agosto 2009
Lembranças do dia de hoje
Neste mesmo dia, mas há 14 anos, baptizava-se no Estoril uma criança aparentemente igual a tantas outras. Há evidências fotográficas de ter rido 24 horas depois de ter nascido, talvez por ter ouvido o princípio de uns versos que lhe foram dedicados:
Na Sua bondade sem fim
Quis Deus olhar para mim
Dar-me um pouco do que é seu
Esteve pouco tempo connosco, vítima das leis de um mundo nem sempre perfeito. Mas quem de nós não acredita que há vidas cujo tamanho e impacto nos outros se queda para lá da finitude das horas, minutos, instantes, existências que se não reduzem a cronologias humanas?
Àqueles que a viram nascer, dela se afeiçoaram e a lembram com saudade resta a dimensão da memória e o desafio de viver o melhor possível.
14 agosto 2009
domingo à tarde
saímos de casa.
gola semi-arrebitada,
que pintarola,
apanhor sol de outono
na magistral e douta tola.
que linguagem, menino,
onde ficaram seus modos?
deixei-os em coimbra,
entre outros destroços.
ao domingo à tarde,
como no livro do fernando,
- o fernando namora -,
saímos de casa,vamos à bola,
qu'arejar é preciso
diz aqui o artola.
menino, menino,
heresias em dia santo?
a vida corre-lhe mal,
mas é razão para tanto?
ao domingo à tarde,
que se lixe o escritor,
passeamos pela cidade,
à falta de melhor,
(ia escrever: de calor).
menino, menino,
mas não fazia sol soalheiro?
o menino procura coisas
como agulha no palheiro.
não lhe basta o solzinho,
queria por acaso milagre maior?
diga lá: que acabasse a fome?,
diga cá: encontrar o amor?
menino, menino,
onde ficou a educação, respeito, etc e tal?
dizer assim mal do país,
dizer mal de portugal?
ao domingo à tarde,
ensandecidos da semana,
que cansaço, que torpor,
esquecemos qu'em nós manda:
a nossa algibeira
(mai-la do senhor doutor).
menino, menino,
que poeta tão limitado,
erra na métrica e no verso,
faz impressão,
ainda morre de fome,
tenha cuidado.
Deus-lhe pague o aviso,
e do chão erga o mendigo
que qual Cristo ajoelhado
pedia a quem passava:
- tenho fome, piedade.
essa agora, mendigo do diabo,
estragas assim o domingo,
pensas qu'isto é o quê?!
(apenas mais um domingo na cidade,
bem se vê..)
menino, menino,
que mal disposto anda,
homem feito por fora,
mas vê-se à légua a criança.
herança de livros e discos,
de mãe e pai e tudo,
feche-se em casa ao domingo,
saia só no entrudo.
que isto de aturar humores
de poetas mal arrimados
é dos piores terrores
alguma vez inventados.
claro que falo de mim,
acredite se quiser,
olho-o, faz-me pena,
lembra-me a minha mulher.
coisa assim nunca vi,
essa incapacidade de ser forte,
tome juízo, menino,
apanhe de vez o norte.
ao domingo à tarde,
petece morrer.
ou então espantar a dor,
no corpo de uma mulher.
se é isto o domingo,
dia santo de guarda,
ou perdemos toda a fé
ou a gente anda parva.
shopping mall e internet
passeios e futebol
eis a nossa condição:
trocar a vida por nada
e agradecer com devoção.
menino, menino,
insiste na diabrura?
olhe que gente que pensa e sofre e sente
lugar já aqui não tem,
moram todos no cemitério
ou no coração de sua mãe.
gi
13 agosto 2009
Pensamentos e músicas para o dia de hoje
Não consigo fugir ao lugar-comum: controlamos pouco a vida que vivemos, somos donos de algo mais do que nada. Os planos de uma mulher desfazem-se quando, no espaço de um instante, lhe é comunicada a sua infertilidade; a alegria quase incontida de uns pais é cortada se, numa observação de minutos, realizam a deficiência do seu filho ou são confrontados com uma doença grave que o atingiu; a carreira de um jovem termina numa curva da estrada e numa cadeira de rodas. No reverso da medalha, dois olhares estranhos que se cruzam na impessoalidade de uma festa podem dar origem a um encontro de almas; a leitura, inexplicável aos olhos da estatística, de uma carta surpreendente dá lugar a um novo encantamento; uma fotografia, um excerto de filme, uma música, pedaços de coisas que se ouvem ou vêem abrem um sorriso numa tristeza que se instalou sem regresso aparente. Em tudo - na luz e na sua ausência - há espaço para uma segunda oportunidade e para a pergunta: o que faço eu com isto que me aconteceu?
O post de hoje é dedicado a quatro pessoas (A, T, A e M) que sentiram bem esta ausência de domínio sobre os acontecimentos. Entre o contentamento e o desgosto, entre a gargalhada e o choro, entre a mão que acena numa alegria de regresso e a que vai à garganta para conter um soluço, há um instante, um fio de cabelo. Para elas vai a minha lembrança, a minha oração, e a confiança na capacidade que todos temos de reiventar o caminho e de olhar a vida de frente, na certeza de que o futuro é uma carta fechada que nos pede para ser aberta.
JdB
A morte nada é.
Eu estou apenas noutro lado,
Eu sou eu, tu és tu.
Aquilo que éramos um para o outro
Continuamos a ser.
Chamem-me como sempre me chamaram.
Falem-me como sempre me falaram.
Não mudem o tom da vossa voz.
Nem façam um ar solene ou triste.
Continuem a rir daquilo que juntos nos fazia rir.
Brinquem, sorriam, pensem em mim,
Rezem por mim.
Que o meu nome seja pronunciado em casa
Como sempre foi;
Sem qualquer ênfase,
Sem qualquer sombra.
A vida significa o que sempre significou.
Ela é aquilo que sempre foi.
O “fio” não foi cortado.
Porque é que eu,
Estando longe do vosso olhar,
Estaria longe do vosso pensamento?
Espero-vos, não estou muito longe,
Somente do outro lado do caminho.
Como vêem,
Tudo está bem.
Henry Scott Holland
12 agosto 2009
Pensamentos dos dias que correm
Em todos os males que nos acontecem, olhamos mais para a intenção do que para o efeito. Uma telha que cai de um telhado pode ferir-nos mais, mas não nos desola tanto como uma pedra atirada de propósito por uma mão maldosa. O golpe, por vezes, falha mas a intenção nunca erra o alvo. A dor física é a que menos se sente nos ataques da sorte e, quando os infortunados não sabem a quem culpar pelas suas infelicidades, culpam o destino, que personificam e ao qual atribuem olhos e uma inteligência disposta a atormentá-los intencionalmente.
É o caso de um jogador que, irritado com as suas perdas, se enfurece sem saber contra quem. Imagina que a sorte se encarniça intencionalmente para o atormentar e, encontrando alimento para a sua cólera, excita-se e enfurece-se contra um inimigo que ele próprio criou. O homem sábio, que em todas as infelicidades que lhe acontecem só vê golpes da fatalidade cega, não tem essas agitações insensatas; grita na sua dor, mas sem exaltação, sem cólera; do mal que o atinge só sente os ataques materiais, e os golpes que recebe podem ferir a sua pessoa, mas nenhum atinge o seu coração.
Jean-Jacques Rousseau, in 'Os Devaneios do Caminhante Solitário'
11 agosto 2009
Pensamentos dos dias que correm
Dirigirmo-nos a alguém com a missão de que se transforme noutro, é irmos com a embaixada de que ele deixe de ser ele. Cada qual defende a sua personalidade, e só aceita uma mudança na sua maneira de pensar ou de sentir, na medida em que esta alteração possa entrar na unidade do seu espírito e enredar-se na sua continuidade; na medida em que essa mudança se puder harmonizar e se conseguir integrar com tudo o resto da sua maneira de ser, pensar e sentir, e possa, por outro lado, enlaçar-se nas suas recordações. Nem a um homem, nem a um povo - que, em certo sentido, também é um homem - se pode exigir uma mudança, que desfaça a unidade e a continuidade da sua pessoa. Pode-se mudá-lo muito, quase até por completo; mas sempre, dentro da continuidade.
Miguel de Unamuno, in 'Do Sentimento Trágico da Vida'
10 agosto 2009
Pensamentos dos dias que correm
Às vezes também é preciso chegar até a embriaguez, não para que ela nos trague, mas para que nos acalme: pois ela dissipa as preocupações, revolve até o mais fundo da alma e a cura da tristeza assim como de certas enfermidades. E Líber foi chamado o inventor do vinho não porque solta a língua, mas sim porque liberta a alma da escravidão das inquietações; restabelece-a, fortalece-a e fá-la mais audaz para todos os esforços. Mas, como na liberdade, também no vinho é salutar a moderação. Crê-se que Sólon e Arcésilas eram dados ao vinho; a Catão, reprovou-se-lhe a embriaguez: mais facilmente se fará honesto esse crime do que Catão desonroso.
Séneca, in 'A Traquilidade da Alma'
09 agosto 2009
XIX Domingo do Tempo Comum
EVANGELHO – Jo 6,41-51
Naquele tempo,
os judeus murmuravam de Jesus, por Ele ter dito:
«Eu sou o pão que desceu do Céu».
E diziam: «Não é ele Jesus, o filho de José?
Não conhecemos o seu pai e a sua mãe?
Como é que Ele diz agora: ‘Eu desci do Céu’?»
Jesus respondeu-lhes:
«Não murmureis entre vós.
Ninguém pode vir a Mim,
se o Pai, que Me enviou, não o trouxer;
e Eu ressuscitá-lo-ei no último dia.
Está escrito no livro dos Profetas:
‘Serão todos instruídos por Deus’.
Todo aquele que ouve o Pai e recebe o seu ensino
vem a Mim.
Não porque alguém tenha visto o Pai;
só Aquele que vem de junto de Deus viu o Pai.
Em verdade, em verdade vos digo:
Quem acredita tem a vida eterna.
Eu sou o pão da vida.
No deserto, os vossos pais comeram o maná e morreram.
Mas este pão é o que desce do Céu
para que não morra quem dele comer.
Eu sou o pão vivo que desceu do Céu.
Quem comer deste pão viverá eternamente.
E o pão que Eu hei-de dar é a minha carne,
que Eu darei pela vida do mundo».
08 agosto 2009
Cresceram lá na avenida, na Avenida da Liberdade, e por ali aprenderam o melhor da mocidade
Belo rancho na Avenida era o do Senhor Pompeu. Trigueirinhas as meninas, louro e claro o rapazinho. Tinha um gosto no petiz, que no dia em que ele nasceu, pagou ginjas, o Pompeu! E agora, fecho a loja. Vai fechar a drogaria?! Nãão, homem! Quero é ver se não vêm mais filhos. Vocemessê tá ciente do que é casar três moçoilas? São duas cousas terríveis, em simultâneo: o trabalho e a despesa. Fora a fúria da criada, de cuidar da pequenada. Diz sentir-se enfastiada. Coitadinha. Não faz nada! Não dê ouvidos Pompeu. Isso é conversa fiada, alfinetada. Tem razão. Dá outra ginja, ó Leitão.
Tão serena a Amélinha, que criança encantadora. No Passeio com a madrinha, quem se lembra de as ver, nunca houvera de dizer. Que o anjinho ao crescer viria logo escolher fraco caminho na vida. Tanto se empenhou o pai, viúvo novo demais, em proteger a menina, para ela depois teimar, que queria ser dançarina. Há quem diga que foi birra, outros, força do talento, e, tivesse a pequena mãe, dissipava-se o tormento. Mesmo contra as vontades, no Teatro triunfou, plena de engenho e arte, o seu nome ecoou. Amélia passou a estrela, era amiga de escritores. Um dia o pai foi vê-la e elogiou-lhe os valores.
DaLheGas
07 agosto 2009
o rapaz raro
diria dele outro rapaz dourado - rimbaud.
um rapaz que guardava um tesouro,
diria, aqui ao lado,
o muito nosso josé miguel silva.
um dia foi só um rapaz
como os outros:
sorridente,
travesso,
luminoso.
como são todos os rapazes.
quando hoje, em busca de magia,
nos ajoelhamos perante as canções,
é a catedral que veneramos.
mas, antes e depois e além da catedral,
houve um rapaz.
como todos os rapazes.
nos
que existiram,
nos
que existem,
nos
que existirão:
em todos eles há,
preciso e precioso,
um derradeiro gosto a verão.
depois foi nick drake,
mas esse já conhecemos
(wikipedia e bibliografia).
o que nunca saberemos
é onde o olhar do rapaz
se perdeu para sempre,
em que margem ficou,
essa coisa que no ainda rapaz vemos
essa coisa a que chamam alegria.
gi
06 agosto 2009
Memórias dos dias que correm
(…)
Ontem, pela hora de jantar, éramos cinco à volta de uma mesa redonda no Pointe, um estabelecimento de diversão nocturna propriedade do Sr. Quintas, que assegura ter sido, em tempos mais idos, o cantor romântico de maior sucesso na África Austral.
Posso assegurar que foi o local mais interracial que conheci em toda a minha vida: encontrei angolanos, locais brancos e pretos, portugueses, um médico da ex-Jugoslávia, um advogado grego, alemães, brasileiros, iranianos, gente da polícia, indianos, diplomatas, pessoas com ar de leste, homossexuais, um chinês e tantos outros cuja proveniência me é desconhecida.
O estabelecimento serve jantares (classificado, no Michelin que me habita os sentidos, como satisfaz / satisfaz pouco). É um restaurante arquitectonicamente algo degradado, esteticamente indefinível, com pormenores curiosos: no cimo da parede, junto à sanca, um friso de lâmpadas verdes e encarnadas brilha em contínuo, revelando um nacionalismo iluminado; nas paredes, quadros diversos, variando entre o impressionismo, marinhas inglesas, tapeçarias ou óleos locais pendurados sem rigor de esquadria nem de cota; a um canto, um sistema traiçoeiro electrocuta insectos esvoaçantes num ruído de fritura; ventoinhas diversas e em profusão, lutando contra a estagnação dos aromas; no topo do salão principal do estabelecimento, dois semáforos grandes, projectando sem qualquer regularidade uma luz avermelhada forte. Indaguei, curioso, se estaria relacionado com algum código entre patrão e empregados, um morse luminoso que agilizasse o serviço, apressando a rotação das mesas. A resposta de um dos meus colegas de repasto veio imediata:
- não! Indica apenas casa de banho cheia…
Perguntar-me-ão, então, o que lá fui fazer, o que leva ao Pointe todo o mundo de Harare, sem qualquer distinção do que quer que seja. Eu explico numa palavra simples – mas demolidora: o karaoke! Na realidade, é esta espécie de semi-playback com legendas que impele dezenas de pessoas, todas as 6ªs feiras para, à volta de uma feijoada, de uma garoupa, de um chicken piripiri ou, simplesmente, de uma cerveja, se divertirem até ao limite da (sua) decência.
A sala não estava ainda quente – embora cheia – e já eu me abalançava para o primeiro teste, sabendo que o clima mundial se altera quando canto. Olhei para uma lista infindável de canções e não encontrei o Requiem de Mozart, espécie musical onde me sinto como peixe na água. Optei por uma toada que conheço, que tem uma letra (na minha imaginação, “assexuada”) que se adequa aos vários mundos em que vivo e que permite aos espectadores cantar em uníssono com o herói que se chega à frente: Che sera, sera.Quando dei por mim, era um artista no palco, com 1,86m, barbudo, um peso a rondar (para cá ou para lá) os três dígitos, pronto a enfrentar o possível arremesso de loiça e de vegetais sobrantes. Quando dei por mim cantava, simplesmente:
When I was just a little girl
I asked my mother, what will I be
Will I be pretty, will I be rich
Here's what she said to me.
Imaginei nos espectadores aquele olhar de espanto que antecede o do nojo ou da fúria – ou simplesmente o da estupefacção. Não sei se terá sido um sonho, mas o facto é que supus alguém, ao ver-me cantar uma música de mulher, a gritar da penumbra do salão:
- canta o like a virgin…
No fundo, dentro de nós vive um cançonetista em permanência, pronto a emergir ao menor sinal de despudor, de descontracção – ou excesso de vinho. Percebi, aos 50 anos, que quem habita o meu canto esmagado de entertainer se chama Doris Day…É isto, meus amigos. O karaoke levou-me, mais tarde, a enfrentar o la bamba e o obla di obla da num dueto de amigos e no recato da mesa.
Entre séries de voluntários (JdC levou uma multidão ao rubro entoando o Here comes the Sun e o Like a Rolling Stone) havia música diversa, para animar uma pista sempre cheia, mista, onde ocupei o meu lugar com a ligeireza que Nosso Senhor me quis dar. No espaço de um instante dançava com gente local e desconhecida uma toada sul-africana, sensual, batida, que me levou ao encanto de uma escultura dengosa e próxima – muito próxima, mesmo - que se contorceu com o à-vontade de quem tem estes sons dentro de si. Entre mim e ela chegou a haver, apenas, os meus óculos de meia-lua. Posso arrimar-me na dança com quem não conheço, roçar o corpo por uma beldade local, mas o facto é que já não vejo bem ao perto.
05 agosto 2009
Músicas dos dias que correm
Pensamentos dos dias que correm
Eça de Queirós, in 'Uma Campanha Alegre'
04 agosto 2009
Poemas dos dias que correm
O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de, vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...
Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo.
Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender...
O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...
Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar ...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar...
Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema II"
Lembranças dos dias que correm
Para duas ALA's, em lembrança do dia 29 de Julho último. Porque há dias felizes...
03 agosto 2009
Poemas dos dias que correm
Aqui na orla da praia
Aqui na orla da praia, mudo e contente do mar,
Sem nada já que me atraia, nem nada que desejar,
Farei um sonho, terei meu dia, fecharei a vida,
E nunca terei agonia, pois dormirei de seguida.
A vida é como uma sombra que passa por sobre um rio
Ou como um passo na alfombra de um quarto que jaz vazio;
O amor é um sono que chega para o pouco ser que se é;
A glória concede e nega; não tem verdades a fé.
Por isso na orla morena da praia calada e só,
Tenho a alma feita pequena, livre de mágoa e de dó;
Sonho sem quase já ser, perco sem nunca ter tido,
E comecei a morrer muito antes de ter vivido.
Dêem-me, onde aqui jazo, só uma brisa que passe,
Não quero nada do acaso, senão a brisa na face;
Dêem-me um vago amor de quanto nunca terei,
Não quero gozo nem dor, não quero vida nem lei.
Só, no silêncio cercado pelo som brusco do mar,
Quero dormir sossegado, sem nada que desejar,
Quero dormir na distância de um ser que nunca foi seu,
Tocado do ar sem fragrância da brisa de qualquer
(Fernando Pessoa)
02 agosto 2009
Oração
«Em tudo somos oprimidos, mas não esmagados;
confundidos, mas não desesperados;
perseguidos, mas não abandonados;
abatidos, mas não aniquilados.»
Assim escrevia São Paulo aos cristãos de Corinto.
A experiência dos momentos mais duros da vida
pode levar-nos a sentimentos como os dos Coríntios,
parecendo que Deus Se esqueceu de nós.
Pelo contrário, São Paulo relembra
que o mal e a dor, a doença ou a injustiça,
não têm a última palavra sobre a nossa vida
porque transportamos connosco a certeza de que o Senhor ressuscitou.
É esta certeza, e só ela, que pode mudar a nossa maneira de viver,
o modo como enfrentamos a pressão dos problemas, as dúvidas sobre o futuro,
a solidão dos dias de aridez ou o cansaço de um caminho sofrido.
E esta mesma certeza de que o Senhor ressuscitou,
leva-nos mais longe e traz consigo
uma alegria que nos surpreende e aos que vivem ao nosso lado.
Porque alarga o nosso olhar e não nos deixa reféns do que não temos,
libertando-nos dessa fixação na falta
e revelando-nos tudo o que de bom e grande nos é dado e prometido.
Só esta certeza, que é Graça, consegue converter
a desesperança em confiança e o desconsolo em gratidão.
E haverá maior paz do que a de um coração grato?
Com São Paulo, também eu arrisco dizer:
«Acredito, por isso vos digo isto».
Rui Corrêa d'Oliveira
XVIII Domingo do Tempo Comum
Naquele tempo,
quando a multidão viu
que nem Jesus nem os seus discípulos estavam à beira do lago,
subiram todos para as barcas
e foram para Cafarnaum, à procura de Jesus.
Ao encontrá-l’O no outro lado do mar, disseram-Lhe:
«Mestre, quando chegaste aqui?»
Jesus respondeu-lhes:
«Em verdade, em verdade vos digo:
vós procurais-Me, não porque vistes milagres,
mas porque comestes dos pães e ficastes saciados.
Trabalhai, não tanto pela comida que se perde,
mas pelo alimento que dura até à vida eterna
e que o Filho do homem vos dará.
A Ele é que o Pai, o próprio Deus,
marcou com o seu selo».
Disseram-Lhe então:
«Que devemos nós fazer para praticar as obras de Deus?»
Respondeu-lhes Jesus:
«A obra de Deus
consiste em acreditar n’Aquele que Ele enviou».
Disseram-Lhe eles:
«Que milagres fazes Tu,
para que nós vejamos e acreditemos em Ti?
Que obra realizas?
No deserto os nossos pais comeram o maná,
conforme está escrito:
‘Deu-lhes a comer um pão que veio do céu’».
Jesus respondeu-lhes:
«Em verdade, em verdade vos digo:
Não foi Moisés que vos deu o pão do Céu;
meu Pai é que vos dá o verdadeiro pão do Céu.
O pão de Deus é o que desce do Céu
para dar a vida ao mundo».
Disseram-Lhe eles:
«Senhor, dá-nos sempre desse pão».
Jesus respondeu-lhes:
«Eu sou o pão da vida:
quem vem a Mim nunca mais terá fome,
quem acredita em Mim nunca mais terá sede».
01 agosto 2009
Músicas dos dias que correm
Em lembrança do concerto de ontem à noite em Cascais. Uma boa companhia, que me desafiou a ir, mas cuja simpatia não foi suficiente para eu deixar de reconhecer a minha profunda ignorância em termos de música "moderna". Gostei muito de ir, porque este saber continua a não ocupar lugar.
JdB
À “oração pagã”, de gi
É obra minha a morte própria
Mas “que assim seja”, terás razão
No teu conselho sereno, sem pressa,
De palavras fortes,
Marés altas,
Luas cheias,
Levanto-me, pueril e sem tormento!
Nem sei se foi verdade o que escreveste.
Tu ris-te.
Depois, faço só nosso o tal momento.
E parece-me que o tempo não existe.
DaLheGas
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