10 julho 2013

Da paz e da paisagem

Fotografia do homem de Azeitão, JMAC


A história foi-me contada na primeira pessoa. No fim de uma aula de ginástica, naquele momento zen em que se apela ao relaxamento do corpo e da mente, o professor terá exortado os alunos a pensarem num local onde tenham sentido paz. A pessoa que me contou teve um assomo de angústia, pois não se lembrava de nenhum sítio onde a tivesse encontrado alguma vez.

Quando me contaram a história elegi, interiormente e de imediato, o local onde tinha encontrado um sossego que não mais esqueceria. A minha disposição pessoal estava minada, por aqueles dias, de algumas preocupações. Mas o local por onde deambulei sozinho - vasto, silencioso, sempre com vista de mar - foi um poderoso auxiliar na descoberta, ainda que efémera, de alguma tranquilidade. Olho para trás, para um passado ainda recente, e seria este o sítio eleito caso estivesse naquela aula de ginástica.

Como associamos a paz à geografia? Este sossego de alma depende da beleza do local (ou de qualquer outro factor de encanto) ou é-lhe totalmente extrínseco? Em que medida a paz assenta essencialmente em nós, no nosso trabalho interior, sendo a paisagem um mero factor de facilitação? Pensemos no sítio mais feio que já tivemos oportunidade de conhecer. Poderemos sentir uma espécie de exaltação interior se as condições da alma o possibilitassem? Argumentemos de forma inversa, e recordemos o local mais bonito do mundo. Poderíamos ser sustentadamente infelizes confrontados com uma beleza sem par? Que importância tem, de facto, a paisagem na nosso procura de paz?

Olho para trás, para a minha vida de turista tout court, mas também para a minha vida de viajante que atenta nas coisas, medita sobre elas, vê além do desfocado que o imediatismo impõe. Onde encontrei eu paz? E neste sítio por onde deambulei sozinho com uma alma preocupada, terei encontrado paz? Ou encontrei apenas uma ilusão de paz que me foi dada pela amplitude e pelo silêncio? Onde mora a paz dentro de nós? No coração, ou nos ouvidos e nos olhos?

JdB

1 comentário:

Anónimo disse...

Oh dear !! Totally wanting to sink my teeth into this... may I, JdB ...?
A paz, os lugares, deixe-a-mente-vaguear, as paisagens, os passarinhos. Isso é coisa de aula de yoga para principiantes.
A paz interior, a verdadeira ... tem morada permanente na ausência de conflito interior (ou exterior, sendo este reflexo daquele).
E a ausência de conflito interior, oh... haveria tanto para dizer sobre esta pedra preciosa mas não há tempo.
Uma dica: a paz interior, diferente do volátil momento inspirador que sentimos perante uma paisagem majestosa, não se perde. Aliás não somos nós que não a perdemos a ela … é ela que nos encontra sempre.
É o que é pouco divulgado nas nossas sociedades hedonistas e materialistas é que a paz interior (= felicidade) está presente também perante o que é.... feio, esquecido, maltratado, roto, sofredor, sujo e se calhar, até mau e cruel.
Se conseguir sentir compaixão (no verdadeira sentido da palavra, i.e. cum pati, um partilhar de paixão, de pathos, ou seja de sofrimento) se conseguir ver criação e beleza nisso, se mesmo aquilo a que o mundo virou as costas o tocar aí bem no fundo do coração, com aquela exaltação interior de que fala (certamente porque já a sentiu) já sabe, está no caminho certo.
JdB, pelo que li até agora no seu blogue, está no caminho certo.

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