Volto ao tema dos feitios, ainda agradecido por alguns valiosos comentários publicados num post mais abaixo. Não sei se fui totalmente claro no que escrevi, mas também não é relevante. Mais vale ser comentado pela discórdia ou pela menor limpidez de raciocínio e, com isso, aprender com os outros.
Somos detentores de defeitos. Uns mais incómodos para o próximo, outros mais incómodos para o próprio. Os que são profundamente judaico-cristãos olham para os pecados mortais e, vendo-os dentro de si com uma frequência menos correcta, apressam-se à confissão - ou ao lamento, porque o sacramento, agora chamado reconciliação, já teve dias melhores. E pensarão que são orgulhosos, vaidosos, com um gosto pela luxuria ou pela preguiça, etc.
Se tivéssemos de classificar os nossos defeitos, como o faríamos? No pódio estariam os que mais incomodam o próximo, ou que mais nos incomodam a nós? Ou uns confundem-se com os outros? E haverá defeitos socialmente mais aceites do que outros? Qual o peso relativo entre eles? Entre a preguiça e a avareza? Ou entre o guloso (de gula) e o rancoroso? Que peso tem o orgulho, a inveja, o desejo exacerbado de controlo? E como equacionamos as características que, não sendo classificados obviamente como defeito, poderão incomodar o próximo - um certo frio do corpo ou do espírito, a susceptibilidade, o furor opinativo ou de secretismo, a ausência de intimidade que afasta, a surdez ao conselho ou à crítica, o comodismo travestido de lei de conservação da energia? Há alguma vantagem nesta classificação interna? E devemos despromover estas características, arrumando-as na gaveta dos defeitos?
Para que serve este texto que, depreende-se, decorre de um pensamento? Em bom rigor não sei, mas estou certo de ter esgotado o stock de pontos de interrogação. Ocorreu-me quando ontem, por volta das 7.45 e já no regresso da passeata, me confrontei com o nascer do sol. Dei por mim a pensar nisso - no que sou, que peso dou aos defeitos que se agarram a mim por fatalidade ou falta de vontade para os tirar. Tem algum interesse pensar nisso? Pois não sei. Mal não faz - e eu não tenho facebook onde verter os parcos e erráticos pensamentos de que ainda sou capaz.
JdB
1 comentário:
Feitio, não será necessariamente defeito.
Não me passa pela minha cabeça, classifica-los - uns e outros, defeitos e feitios, leia-se - por si, ou em função do que passa ou habita a cabeça dos outros. Antes de mais, seria dar-lhes (aos outros) um enorme poder sobre mim, que não deverão ter. Ao hierarquiza-los assim, estaria a priorizar a importância e valor que os outros dão (a família, o chefe, a sociedade, a associação, o clube, o partido, etc) a alguma faceta individual, com uma conotação pejorativa, arbitrária, discutível, subjectiva, impessoal, exterior, em detrimento da minha própria.
Costumo dizer, que só dou contas a Deus, diariamente, e várias vezes ao dia.
Só nós ( eu e ele) sabemos por dentro da pele, do corpo e da alma. Rente ao coração. Só a mim (sob o seu olhar, leia-se Amor) cabe refletir, ajuizar, ponderar, redefinir, burilar, atenuar, adiar ou esquecer, alguma aresta que Eu, considere imprecisa, acutilante, agressiva, feroz, entediante, desnecessária, diminuitiva, etc. E aqui, também Eu, decido, se é alguma coisa que me afeta a mim em particular, ou se é algo que envolve também o Outro. Por vezes, são coisas que de tão interligadas, não se separam e andam juntas.
Nunca seremos perfeitos, nesta dimensão, penso eu. Mas cabe-me o aperfeiçoamento crescente, gradual e contínuo, a vários níveis. Os japoneses, chamam-lhe, Kaizen. Um conceito bonito e lato.
Não me preocupa, o que os outros pensam sobre os meus defeitos, ou do que eles pensam ser os meus defeitos. Não me preocupa, dar-lhes uma hierarquia, ou um deadline para os eliminar. Sempre que tropeço num deles, tento dar-me o que de direito procuraria dar ao Outro, um olhar compassivo e tolerante(autocompaixão), e se puder, mudo logo ali alguma coisa.
Tudo passará pela minha consciência, pela minha atenção e reconhecimento, pela minha necessidade de mudar o que considero inapropriado/desfavorável/..., e pela minha vontade e açao de mudar.
Um dia de cada vez, um bocadinho de cada vez, step by step, little baby steps. Mesmo que pareça que não conseguimos, nem de nada chega o que já fizemos, já fazemos muito...
Sem culpa, sem atropelos, sem recriminação, sem autoflagelo ou autoboicote, de preferência.
Afinal, já somos perfeitos assim, e dentro das nossas imperfeições, somo Amados.
Obrigada pelo seu texto. Fez-me lembrar também o 'largo da boa hora'. :)
Boa semana, JdB, boas caminhadas.
a.
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