http://www.youtube.com/watch?v=AVpl983ytNg&feature=player_embedded
http://www.youtube.com/watch?v=fVhKPHFzPMQ&feature=player_embedded
As melhores viagens são, por vezes, aquelas em que partimos ontem e regressamos muitos anos antes
Ouvi aí umas duzentas vezes o poeta Tonino Guerra citar o verso de um monge medieval: «É preciso ir além da banal perfeição». É isso mesmo: a perfeição pode ainda ser um caminho que trilhamos pela superfície ou constituir uma ilusão que nos impede de aceder ao verdadeiro e paradoxal estado da vida. Levamos tanto tempo até perder a mania das coisas perfeitas, até nos curarmos do impulso que nos exila no aparente conforto das idealizações, ou finalmente vencermos o vício de sobrepor à realidade um cortejo de falsas imagens! «É preciso ir além da banal perfeição».
Lembro-me de um filme de Nanni Moretti, acho que é “O quarto do filho”, em que uma personagem, estando a viver um duro luto, se coloca a arrumar no armário as chávenas de chá. Percebe então que uma tem um lado partido. Tenta disfarçar o facto, colocando visível apenas o lado intacto. Mas ela sabe que àquela chávena falta alguma coisa. Aquela chávena é o símbolo da sua vida, da nossa vida, que ela e nós temos de aceitar e redescobrir continuamente. Acolher isso é uma condição necessária no amor e na amizade, no viver comum e na maturação pessoal que nos cabe fazer.
Há aquele mote de Samuel Beckett que, se o soubermos ouvir, derrama sobre os nossos embaraços grande luz. Diz assim: «Errar, errar de novo, errar melhor». O que é errar melhor? É saber que, no fundo, erramos sempre. Isto é: a perfeição encontrámo-la nos catálogos, mas não nos nossos gestos ou em nós próprios. O mais sensato é mesmo adotar a humilde sabedoria de quem procura conscientemente o melhor, mas sabe que o seu melhor ficará ainda aquém. O que podemos aprender é, pois, a semear, num trabalho de confiança, de desprendimento e simplicidade cada vez maiores. Jung escrevia: «o importante não é ser perfeito, mas sim inteiro». E para nós, o que é realmente importante?
Durante anos tive em casa um cartaz de uma peça de teatro infantil, de um grande autor italiano. Para saber falar às crianças como ele o faz, a gente percebe que se tem de apetrechar não apenas uma enorme habilidade, mas uma afetuosa esperança. Os miúdos sabem distinguir bem quem lhes fala para entreter ou quem realmente lhes quer comunicar uma verdade de coração. Este autor, chamado Gianni Rodari, é assim. Durante anos tive um cartaz seu com esta frase: «errando também se inventa». Olhar para aquela frase transmitia-me o ânimo e a leveza de que precisava.
A perfeição coloca-nos perante a realidade como se de um facto consumado se tratasse: se formos mexer, intervir, retocar ou alterar, sentimos isso como uma perturbação. Essa perfeição é estática. Existe só para ser admirada… à distância. A imperfeição, porém (e penso também naquelas que identificamos na nossa vida interior), é uma história ainda em aberto, que conta ativamente connosco. Na imperfeição é sempre possível começar e recomeçar. A imperfeição permite-nos compreender a singularidade, a diversidade, o real impacto da passagem do tempo, o traço dos seus vestígios. A imperfeição humaniza-nos.
In Diário de Notícias (Madeira)
21.05.11
O “Grupo de Baile”, composto por rapazes amigos da outra banda (Seixal) teve, no início dos anos 80, um êxito retumbante com esta música, com vendas superiores a 100 mil cópias. Que eu saiba, foi um assinalável mas efémero sucesso, já que nada mais fez de relevante, tendo desaparecido como apareceu, tipo cometa. Reapareceu apenas muito episodicamente, em ocasiões especiais, em festivais ou na televisão. Os músicos que o compunham têm profissões tão parecidas como membro das orquestras do Exército, da Marinha ou da GNR, funcionário camarário, entertainer de cruzeiros turísticos ou engenheiro da Lisnave!
Sempre gostei desta música, sobretudo da parte instrumental, faz-me lembrar os bailaricos das várias terrinhas a que o “pessoal” ia no Verão, nas noites quentes, nos largos térreos engalanados, nas barraquinhas de fritos, bifanas e bebidas, nos pares dançantes homem/mulher e, as mais das vezes, mulher/mulher, face à crónica indecisão masculina ou, pior, à escassez do género. Lá estavam também, como diria o Sérgio Godinho, as “moças mais lindas do bairro operário”, sob os olhares atentos das mãezinhas e das vizinhas, que com gosto e ingenuidade observávamos e os mais ousados convidavam para um pé de dança no terreiro.
A letra é qualquer coisa! Só poderia vir da mente iluminada de um nativo de uma destas áreas periféricas. Atendendo a que há uma palavra dispensável, procurei uma versão censurada (que a havia, lembro-me bem), mas não a encontrei. Assim, peço ao dono deste estabelecimento e às senhoras que me lêem (poucas, por certo!), que relevem esta falta. De qualquer forma, não resisto à graça fácil de realçar a curiosidade de esta mesma palavra ter levado a que uma eminência graúda deste País tenha, por causa dela, sido recentemente remetida com urgência para o Brasil, a benefício dos votos por que o seu próprio partido espera e desespera.
Espero que gostem, apesar de tudo!
fq
A explosão de perguntas suscitadas pelo filme – muitas, implicitamente – parece emergir da mente efervescente e reivindicativa dos adolescentes em acção. A sua atitude desafiante, provocatória, põe os adultos violentamente em causa. Corresponde ao grito desajeitado que nasce do legítimo pedido de verdade, de coerência, em que o mundo dos crescidos será tão falho… Arrastando-se pela vida num frenesim anestesiante, estes parecem ter adiado as grandes questões sobre o sentido da existência para uma fase longínqua, associada à desaceleração que o envelhecimento comporta.
Através da personagem do pai-médico interrogamo-nos se o mérito do trabalho realizado nos confins de África será, algum dia, reconhecido na Dinamarca ou trará algum benefício à família, que mal o vê? Se a pequena decisão tomada ontem, levianamente, terá consequências nas 24 horas seguintes? Curiosamente, tudo indica que sim… ao menos no próprio, porque é de pequenos gestos diários que somos feitos. Nesse sentido, nada se perderá da assistência dada na savana tropical, ainda que a Europa rica e auto-suficiente não tenha olhos para a apreciar. Mas transportamo-la no coração. Ela penetra-nos até ao âmago e ganha corpo em nós – tornamo-nos nela, pelo que essa bondade concreta passará a estar onde estivermos.
O expoente da fase de construção do ser humano ocorre na adolescência, onde o voluntarismo da idade, neste caso potenciado pelas condições privilegiadas de um país desenvolvido, esconde a enorme fragilidade desses pequenos homens em devir, em fase experimental de afirmação pessoal. Sob o ponto de vista interior é uma aventura maior para a humanidade, em nada menor do que as expedições humanitárias em favor das tribos subsaharianas.
No extremo oposto, os adultos correm o risco de se perder em deambulações estéreis, entre o ressentimento (por vezes, má consciência) do vivido e o medo do que virá, arriscando-se a ficar prisioneiros de um passado mitificado ou de um futuro irreal. Basicamente acantonados numa atitude escapista, que se esquiva a encarar os factos.
Nos mais novos, uma exigência insaciável (até feroz) de verdade, que confundem com sinceridade associal e cruel. Nos mais velhos, o comodismo flácido da meia-verdade, onde a mentirinha confortável é socialmente bem tolerada.
Nos mais novos, os grandes gestos, os desafios arrojados e, muitas vezes, irresponsáveis. Nos mais velhos, as escolhas hábeis, medidas ao milímetro, com pouca alma e nenhuma graça.
Torna-se um diálogo praticamente impossível entre gerações.
Só não esperávamos a manifesta falta de civismo nas sociedades nórdicas. Nem a xenofobia exacerbada entre dinamarqueses e suecos. Nem o laxismo e ineficiência das autoridades. Contávamos apenas com o isolamento pesado entre pessoas de todas as idades e classes, abandonadas à sua sorte, seja na casa de férias junto ao lago silencioso, seja no quarto do hospital, seja nas boas-vindas gélidas à chegada ao aeroporto após uma longa ausência.
Paradoxalmente, é no pior momento que desponta o melhor nos corações dos teenagers. Converte-se, assim, num anti-climax positivo. No furor justiceiro, para o qual o miúdo empreendedor arrasta o miúdo bondoso e influenciável, ressurgem os ingredientes mais benignos da amizade: a verdade e a reciprocidade na relação, a coragem em favor do outro, a dedicação mútua. Salvou-os essa lealdade, posta à prova na circunstância mais dolorosa. Por fim, também a presença paterna, que tardara em aparecer, resgatou-os de um desfecho brutal. Porque só em face do risco de uma perda irremediável, os pais descobriram novas formas de relançar o diálogo com os filhos. Quando acreditaram que estava ao seu alcance melhorar o mundo, tudo começou a mudar. Salvou-os, essa fé na própria vida. Sabiamente, Gandhi aconselhava: «Seja a mudança que quer ver no mundo». Tão simples mas tão exigente.
Trailer de EM UM MUNDO MELHOR - Legendado por claquete_com no Videolog.tv.
Maria Zarco
(a preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)
_____________
(1) FICHA TÉCNICA
Título original: HAEVNEN
Título traduzido em Portugal: NUM MUNDO MELHOR
Realização: Susanne Bier
Argumento: Susanne Bier, Anders Thomas Jensen
Produção: Sisse Graum Jørgensen
Fotografia: Morten Søborg
Banda sonora: Johan Söderqvist
Duração: 118 min.
Ano: 2010
País: Suécia /Dinamarca
Elenco
Mikael Persbrandt (Anton, o pai-médico),
William Jøhnk Nielsen (adolescente rebelde e reivindicativo),
Markus Rygaard (adolescente patinho feio)
Trine Dyrholm, (a mãe)
Wil Johnson,
Eddie Kihani,
Emily Mglaya,
Gabriel Muli,
Ulrich Thomsen
Site oficial:
Prémios: Óscar do Melhor Filme Estrangeiro,
Globo de Outro do Melhor Filme de Língua Estrangeira.
Confesso que não gosto muito desta imagem do “rebanho”, de andarmos todos “em bando”, de seguirmos “cegamente” um pastor que lidera o caminho. Sou uma pessoa independente, com opinião própria, com capacidade de tomar a minhas próprias decisões e, por isso, esta coisa de andar em bando não tem muito a ver comigo. No entanto, no texto do Evangelho, há uma frase crucial sobre a qual vale a pena debruçarmo-nos “Ele chama cada uma delas pelo seu nome ....”. De facto, de entre o rebanho imenso que constitui a humanidade, Deus conhece cada um de nós individualmente, conhece-nos as fraquezas, as alegrias, as inquietações, chama cada um de nós pelo seu nome e não impõe a liderança; pelo contrário, chama-nos e nós ao ouvirmos a sua voz, seguimo-lo de livre vontade. Esta perspectiva vem, também, dizer-nos que todos nós, sem excepção, sejamos bons ou maus, católicos ou muçulmanos, santos ou pecadores, temos a oportunidade de seguir a Cristo, de nos entregarmos a Ele, seguindo o seu caminho e os seus ensinamentos. Nada nos é imposto; basta que estejamos atentos e queiramos ouvir a Sua voz e, ouvindo-a, nos dispomos a segui-la. Existe alguma coisa mais bonita que isto? Somos livres de seguir a Cristo, ou não! Seguimo-lo por O amamos e somos amados por Ele. Somos livres de nos afastarmos d’Ele e somos livres para nos re-aproximarmos d’Ele. Podemos estar uma vida inteira afastados, mas basta que, no último instante, nos dispomos a segui-Lo e Ele aí estará, pronto para nos acolher, pronto para nos chamar pelo nome próprio. Existe alguma coisa mais bonita que isto? É o Amor em Liberdade. É a Liberdade do Amor. É um Amor que só pode vir do Céu.
Domingo, Se Fores à Missa ...... Decide em liberdade !
Maf
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
Naquele tempo, disse Jesus: «Em verdade, em verdade vos digo: Aquele que não entra no aprisco das ovelhas pela porta, mas entra por outro lado, é ladrão e salteador. Mas aquele que entra pela porta é o pastor das ovelhas. O porteiro abre-lhe a porta e as ovelhas conhecem a sua voz. Ele chama cada uma delas pelo seu nome e leva-as para fora. Depois de ter feito sair todas as que lhe pertencem, caminha à sua frente e as ovelhas seguem-no, porque conhecem a sua voz. Se for um estranho, não o seguem, mas fogem dele, porque não conhecem a voz dos estranhos». Jesus apresentou-lhes esta comparação, mas eles não compreenderam o que queria dizer. Jesus continuou: «Em verdade, em verdade vos digo: Eu sou a porta das ovelhas. Aqueles que vieram antes de Mim são ladrões e salteadores, mas as ovelhas não os escutaram. Eu sou a porta. Quem entrar por Mim será salvo: é como a ovelha que entra e sai do aprisco e encontra pastagem. O ladrão não vem senão para roubar, matar e destruir. Eu vim para que as minhas ovelhas tenham vida e a tenham em abundância».
Palavra da salvação.