04 novembro 2014

Carta a um anjo

Foi hoje, mas há treze anos. Os versos que vamos arrumando como nos apetece continuam a ser teus, exclusivamente teus.

Na Sua bondade sem fim
Quis Deus olhar para mim
Dar-m'um pouco do que é seu
Deu-m'uma estrela pequena
A quem chamou Madalena
Que é um dos anjos do Céu




Nos últimos tempos muitas pessoas falaram de ti, pese embora nunca te tivessem visto nem soubessem da tua existência. Foi aquela mãe colombiana que teme pela saúde da filha que piorou passados dez anos. Foi a outra mãe, que eu já conhecia, que falou do filho que partiu há alguns anos, ou a espanhola que não sorri mas cujo filho é um sobrevivente antigo. Foi a médica que falou do drama das crianças da Etiópia, da esperança que surge com o que se faz por lá. Foi o investigador que mencionou os tratamentos inovadores, algumas estatísticas que não melhoram, a maior qualidade de vida. Foi ainda aquela rapariga portuguesa, sorridente na sua saúde, que referiu os maus momentos por que passou, o coração de hoje mais atento a tudo. Foi a mãe que falou comovida do filho que ela viu morrer duas vezes mas que lutou e ganhou. Foram as professoras que falaram das brincadeiras, dos chapéus pintados que tapam as carecas que são a marca evidente da doença. Foi a psicóloga que falou na montanha russa dos pais, nos momentos de sufoco, nos dias zero de cada instante.

Toda esta gente - e alguém há-de perdoar-me a ousadia e a presunção - olhou fixamente para mim para me falar de ti e no que albergas na eternidade onde vives: o sufoco, a partida, a esperança, o riso, os barretes coloridos, o sentido das coisas, a fé, o desalento, a certeza, o espanto, a injustiça da vida, o olhar que se demora no horizonte onde tudo se realiza. Estás presente em cada filme, em cada gráfico, em cada palavra, em cada referência, em cada soluço discreto ou lágrima evidente, em cada criança que sorri, que sorri, que sorri. Estás presente na luz dos dias mansos, na certeza da imortalidade, no colo infinito de Nossa Senhora, na nostalgia das lembranças, na agitação dos dias saudosos. Estás presente como ponto de união nas diferenças, como mão pacificadora nas palavras agrestes, como elemento que junta o que já foi uno. Estás presente como pó do Amor que tudo redime e tudo salva.

Foi hoje, mas há treze anos. Continuas a ser tudo em cada um de nós.

JdB, em nome de todos os outros que sabes quem são.

7 comentários:

Anónimo disse...

"Conhecidos de Deus" são todos eles .
Quanta luz, amor e fé irradia o teu Anjo, e porque tu sabes e queres ver , encaminham-se na graça para o econtro eterno.

Anónimo disse...

Um beijo grande zica

Anónimo disse...

Muito obrigada, JdB, pelo seu testemunho tocante e profundíssimo. Bjnh, M.Zarco

Anónimo disse...

Podes continuar a crer JdB, que o teu anjo está e estará presente, rodeando-te e a todos com a luz do Amor que tudo regenera, para sempre.

Agradeço a partilha e a sua doçura.

arit netoj disse...

Querido João,
Mais uma vez deixa-nos a paz que vem do céu... aquela que só Deus dá.
Obrigada pelo tanto que se dá.
Beijinhos

Anónimo disse...

Não tenho palavras para a beleza e o nó de garganta que estes seus posts me suscitam.
Mesmo sem pertencer a qualquer confissão religiosa, percebo e sinto quem vive em graça, aquela graça muito especial de quem - ainda nesta vida - retira a sua maior inspiração de algures muito para além da vida.
V

JdB disse...

Agradeço a todos as palavras simpáticas - muito mais do que apenas simpáticas - que me encheram este dia e que ficaram a ressoar dentro de mim.
Graça também é isto.

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