17 setembro 2015

Da vida que pode ser uma gaita

10.09.2015 (fotografia de JMAC, o homem de Azeitão)

Conheci-a em 2001, ano de todos os perigos. Já nessa altura tinha uma vida familiar desafiante, fruto de certezas e de interrogações, que estas últimas podem ser piores do que as primeiras. Mesmo assim encontrou tempo para se juntar a dois desconhecidos que se juntavam a tantos outros com um objectivo comum, maior do que todos. Ficámos amigos. Devo-lhe o que me mostrou, o que é, com todas as imperfeições que são inerentes à nossa condição humana. Nos últimos dias voltou a ser abalada por um sufoco, uma interrogação uma visão preocupada do futuro. Mas uma, que já lhe conheci vários. 

A vida de cada um de nós é um desafio muito grande: àqueles a quem a vida corre sempre bem, o que fazer de tanta felicidade; àqueles que são confrontados com um ou dois ou três acontecimentos funestos, como encontrar paz; àqueles para quem a vida é um permanente sobressalto, como seguir em frente. 

Há alturas na nossa vida em que a fé nos salva, a confiança no futuro nos salva; há momentos em que são as nossas redes sociais de apoio, porque nos acontece o mesmo que aos outros, mas esses estão sozinhos, sem ninguém que os oiça ou lhes ampare um desabafo; há momentos em que é a descoberta do sentido para as coisas, seja num amor, num desgosto, num empreendimento. Mas há momentos em que nada faz sentido. Quando morreu o Pe. Ricardo, um homem bom, que tocou uma infinitude de pessoas, que mudou a vida de tantas outras, afirmei isso: não me falem da Páscoa de Jesus, não me falem da vida eterna. Agora quero alguém que me acompanhe na irritação, talvez no estupor com que olho para os dramas que acompanho. 

Às vezes não há nada que nos salve, porque o sentimento de espanto, de injustiça, de cansaço, se sobrepõe a tudo. Às vezes, por mais crentes que sejamos, temos o direito à indignação de olhos postos no alto. Que já chega, que me deixem os meus em paz, que me deixem encher o peito de ar para enfrentar mais uma onda que me engole. 

A fé salva-nos, mas a vida por vezes é uma gaita. E está muito longe de ser justa...

JdB      

1 comentário:

Anónimo disse...

Perdoar a Deus é o maior e mais intenso exercício da fé.

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