22 dezembro 2021

Vai um gin do Peter’s ?

O PRESENTE DE NATAL DO RAPAZ DO TAMBOR 

Curiosamente, a ideia do pastor de menos recursos, que chega ao presépio sem presentes, é recorrente no imaginário popular de países distantes, onde a mensagem de pobreza associada ao nascimento de Jesus, se entrelaça com um outro sentido de riqueza: o de quem oferece a vida. 

Em Portugal, como em Espanha, artesãos e escultores criaram a figura do pastor mais desfalcado do grupo de párias, que passava a noite ao relento com os rebanhos, quando todos foram surpreendidos por coros de anjos, que os guiaram até uma gruta misteriosa. Chegado à gruta, esse pastor sem presentes lembrou-se de oferecer ao Bebé uma vénia convicta, acentuada pelo retirar do seu chapéu de abas largas. A força simbólica do gesto tornara-o num presente interpelativo, sendo comum aparecer em primeiro plano nas maquinetas de presépios antigos do Sul da Europa. 


 Em plena Segunda Guerra Mundial, corria o ano de 1941, uma compositora norte-americana também se focou na ideia do pastor indigente, sem nada para dar ao Bebé anunciado pelos anjos. Katherine Kennicott Davis inspirou-se no refrão de uma canção francesa «patapan», para compor uma ária natalícia ao jeito do American way of life, em que as soluções criativas costumam envolver contributos pessoais activos. Assim surge a figura do pastor mais novo, que, no último minuto, descobre entre os seus modestos talentos uma dádiva única: dedicar ao Menino uma exibição ao som do tambor, que montara a partir dos materiais que a natureza lhe proporcionara. Se servia para se distrair nos dias longos a guardar o rebanho, o mesmo ‘pa-rum-pum-pum’ poderia animar um recém-nascido. Tudo sumamente elementar e, talvez por isso, com um encanto natalício. Assim surge a canção «Carol of the Drum», mais tarde cunhada de «The little drummer boy». 

Das muitas interpretações, a actuação ternurenta do pequeno cantor sul-coreano, a actuar como solista do coro mais premiado do seu país ‘Gracias Choir’(1), transporta-nos para a cena deliciosa, que seria o pastor de menos recursos acabar por oferecer o presente mais valioso, feito de si próprio

 

A ária concebida para a interpretação coral, também integrou o repertório da família von Trapp  (aquela que foi protagonista no musical de Hollywood “Música no Coração”), que assim a ajudou a espalhar. Mas o grande salto deu-se no final dos anos 50, com os arranjos instrumentais de Halloran (1957) e depois o címbalo de dedos introduzido por Simeone, que o gravou em single (1958). O êxito foi imediato, sobrevivendo 4 anos no top das músicas mais ouvidas nos EUA. O resto da história é conhecido, convertendo-se logo num clássico de Natal, até pela mensagem certeira a valorizar como riqueza suprema o próprio ser humano. 

A interpretação vibrante do coro sul-coreano é marca d’água das suas actuações, comemorativas da vida e de cada momento. Como a vénia do homem do chapéu. Fundado em 2000, com raiz cristã, tem a intenção expressa de espalhar ânimo através do calor da linguagem mais universal que a humanidade conhece. Isso explicará a sintonia que costuma criar com o público, nas quatro partidas do mundo. O virtuosismo musical do maestro de ascendência russa Boris Abalyan, no grupo desde 2008, reforçou a qualidade daquela formação polifónica, galardoada com a melhor distinção coral do mundo, ganha no Festival Internacional de Marktoberdorf, na  Alemanha, em 2015.  Tentando explicar o que os move e os distinguirá:  «The believe that music changes people’s hearts is what defines Gracias Choir Gracias Choir is officially the best choral music group in the world. (Its) music is inspired by the love and thankfulness toward God that each member embraces… One bold musical color created through self-sacrifice; harmonious sounds birthed from the essence of the soul and forged into transformative music (…) has the unique ability to touch the hearts of its audiences, turning sadness into joy and change lives in the process. The Gracias Choir has spread comfort and hope into people’s hearts through vivid sounds and soul-echoing harmonies.» E se a Terra está sedenta de calor humano e de alegria autêntica. Isto sem complexos para o nosso tempo, pois este lusco-fusco também foi evidente na altura do presépio original, que conheceu consolações mas também desgostos indizíveis, como a onda infanticida de Herodes, que obrigou os pais de Jesus a emigrar para salvar o filho. 

Nas boas interpretações ‘a capella’, os Pentatonix têm uma gravação, que respira igualmente a alegria profunda e simples da Gruta de Belém: 

[Official Video] Little Drummer Boy - Pentatonix - YouTube (ou https://youtu.be/qJ_MGWio-vc

Quem melhor do que o rapazinho, cujo amor a Jesus lhe inspirou o melhor dos presentes, para nos ajudar a aproximarmo-nos do Menino, na Noite Santa que se aproxima.  Com pleno sentido, ressoa na música e no acontecimento de há dois mil anos a grande máxima: se não vos tornardes como crianças…  

Festas Santas e Felizes a todos, 

Maria Zarco

(a preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)

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 (1) Na versão completa do concerto, perto do 28:23):  https://youtu.be/2UxUDByeovc.

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