12 setembro 2024

Do erro *

Franz Kappus escreve a Rainer Maria Rilke confessando-lhe como o passar das suas tristezas é perturbador. Na sua resposta de 12 de Agosto de 1904, Rilke incita-o a considerar se essas grandes tristezas não passaram antes através de si; e diz-lhe: se nos fosse possível ver mais longe do que o nosso conhecimento alcança, e um pouco além dos limites das nossas intuições, talvez então suportássemos as nossas tristezas com mais convicção do que as nossas alegrias». E acrescenta: por que razão haveria de querer excluir da sua vida toda a inquietação, toda a dor, toda a depressão de espírito, quando não sabe que trabalho é que esses estados estão a realizar dentro de si? 

Estas pequenas citações dariam para um artigo sobre tristeza. Mas eu, anarco-revolucionário naquilo que não afecta a riqueza das nações nem a pureza dos costumes, quero fazer um find / replace, e, onde se lê tristeza, passar a ler-se erro. Porquê? Por um motivo prosaico. Afinal, na minha ronda de leituras desta manhã, cruzei-me com o poema abaixo que fala disso mesmo - de erro. E fala, numa leitura minha, pessoal, do erro como espaço fecundo de aprendizagem ou, porque não, do erro de certa forma redentor, que abre espaço à construção de um destino promissor. Não é isto que o poeta quis dizer? Não faz mal, a mim dá-me jeito esta leitura.

JdB

* [Texto aproveitado de um artigo publicado na revista Brotéria (Agosto - Setembro 2024), intitulado Onde firmar os pés sem chão. Manual para ser inteiro, com Santa Teresa do Menino Jesus, de Eduardo Amaral, sj]


***

Dado o caso

Escolhe entre os erros
que tens à tua disposição,
mas escolhe certo.
Talvez seja errado
fazer o que está certo
no momento errado, 
ou esteja certo
fazer o que é errado
no momento certo?
Um passo ao lado,
impossível de corrigir.
O erro certo,
uma vez desaproveitado,
não é fácil que volte a surgir. 

Hans Magnus Enzenberger
(1929 - 2022)
In "66 Poemas"
(Tradução de Alberto Pimenta)

Sem comentários:

Acerca de mim

Arquivo do blogue