Vamos elevar este estabelecimento ao nível da ligeireza - e vamos falar de orquestras numa vertente tão lúdica e ridícula quanto possível.
Declaração de interesses: sou um canhoto estranho, isto é, pouco consistente. Eu explico: escrevo com a mão esquerda, o meu olho director é o esquerdo, seguro uma raquete ou um taco de bilhar na mão esquerda, se quiser dar um murro ou um estalo é com a mão esquerda que o faço e é com essa mão que atirarei uma pedra. Por outro lado, jogo futebol com o pé direito, tal como sou destro a jogar às cartas, a manusear o rato do computador ou a usar a faca de carne ou de peixe à mesa. A tocar uma viola sou também destro mas, se me imaginasse a tocar violoncelo ou violino ou contrabaixo, é a mão esquerda que segura o arco.
Há muito tempo que tenho este olhar curioso para uma orquestra e que formulo esta pergunta que não me é respondida: porque não há canhotos numa orquestra? Eu percebo que não seja possível - por motivos que me parecem de ordem prática - haver um canhoto como eu a tocar violino. Mais do que uma certa inestética, como se fosse um soldado numa parada a marchar em desacerto com os camaradas, há um lógica de ordem prática: o meu arco e o do meu vizinho embateriam forçosamente um no outro.
Vejamos o exemplo do trompete, um instrumento musical de sopro, da família dos metais, constituído por corpo, chave de água, bomba de afinação, pistões, cotovelos e bocal. Os pistões são o componente onde o trompetista carrega (com os dedos da mão direita) para fazer um derivado de sons. Ora, uma vez que o trompete se projecta para a frente do músico, não há nenhum impedimento prático deste carregar nos pistões com os dedos da mão esquerda. Acontece que eu nunca vi um trompetista canhoto, como nunca vi um clarinetista, ou fagotista canhoto. Será que, em toda a história da música e das orquestras nunca ouve um cavalheiro a dizer ao mestre artífice: oh, Josué, faça-me aí um trompete com os pistões do outro lado, que eu nasci canhoto... Temos aqui um problema de inclusão?
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No dia 8 de Dezembro fui representar a Acreditar num concerto solidário com as bandas dos três ramos das Forças Armadas. Voltei a ter um olhar perscrutante: há por aí um grumete canhoto? Não, não havia. E deparei com outra estranheza: nenhuma das bandas tem violino, ausência para a qual, estou certo, haverá uma razão lógica. O meu primeiro pensamento foi lógico: numa banda das Forças Armadas só faz sentido haver instrumentos que se possam tocar em movimento, como numa marcha, por exemplo. Mas depois percebi que havia contrabaixos e violoncelos, pelo que o meu raciocínio caiu pela base.
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Aqui ficam estas notas de superior importância, vertidas em duas perguntas: (1) porque não há canhotos numa orquestra? e (2) porque não há violinos numa banda das Forças Armadas?
JdB
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