28 setembro 2016

Do dito envelhecimento

Numa mesa de amigos fala-se de velhice. Melhor, fala-se de ageing, uma expressão inglesa que não corresponde bem ao nosso envelhecer, mas ao ter mais idade. Alguém afirma peremptoriamente: não vejo qualquer vantagem no 'ageing'

Penso no tema. O meu primeiro impulso é dizer que, de facto, não vejo as coisas assim, pois encontro inúmeras vantagens no ter mais idade. Penso melhor. Associo a juventude a resistência física, a frescura mental, a saúde, a vigor, a ausência de responsabilidades (ou a um menor peso de), a menor preocupação com o presente ou com o futuro, a menos desgostos e a ausência de enervamentos com um desempenho nos aspectos mais íntimos da vida  (no caso dos homens, essencialmente). Perder isto tudo ou parte disto tudo ou outras coisas que não referi afigura-se, de facto, com um motivo de desalento.

O que pode dar-nos o ageing? As angústias com os problema de saúde, com a calvície, com a menor resistência física ou desempenho sexual; a falta de memória, o aumento de peso uma ideia mais próxima de morte. Mas o ageing também nos dá a ponderação, o gozo do tempo ou do silêncio, a experiência de vida, a relação entre aquilo que lemos e aprendemos, o discernimento, alguma tranquilidade face àquilo que já não conseguimos fazer, o encantamento dos filhos ou dos netos. 

O que nos faz dizer que não há, no ageing, nenhuma vantagem, ou que há, no ageing, muitas vantagens? Não sei bem, mas talvez aquilo que privilegiamos mais em determinados momentos da vida. Não consigo deixar de olhar para mim. Foi o ageing que me permitiu voltar a estudar e, nalguns casos, sair tranquilo de uma sala de aula dizendo: não percebi uma palavra, porque, de facto, já tenho pouco a provar a quem quer que seja. É o ageing que me permite, não fixar o que disse Platão, Schiller, Quine, Teixeira de Pascoaes ou Santo Agostinho, mas perceber as relações entre eles, quando as há. Nesse sentido, como argumento apenas, quase poderia dizer-se que o ageing me deu mais do que a juventude. 

Estou mais próximo da morte, é facto. Não me apetece ir já, mas sei que tenho gente à minha espera - e isso não é despiciendo.

JdB

2 comentários:

Luísa A. disse...

A vida mantém-nos sempre incompletos. Em novos, porque dá em vigor o que nega em perspectiva. Em velhos, porque nega em vigor o que dá em perspectiva. Um jogo de compensações que não tenho achado desagradável. :-)

JdB disse...

Gosto de a ver por cá, Luísa. Obrigado pela visita e por uma alface de que já tinha saudades.

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