13 novembro 2008

Bons caminhos

Há dias assim. Semanas assim. Apetece meter umas roupas no saco e bater a porta. Pormo-nos a caminho sem calendário, nem paragens previstas. Ou data de regresso marcada. Acontece-me quando não apetece fechar o livro que tenho entre mãos. Esperar pelo dia seguinte para continuar caminho.

Vou nas primeiras páginas ainda de “O meu país inventado” de Isabel Allende. Sou novata na autora. Este é o segundo livro de Allende que leio, a conselho de amigo, depois de “Inês da minha alma” – não se pode ler tudo, nem tudo o que gostaríamos. Comecei no Chile de quinhentos, dos conquistadores, aterrei agora no Chile do século 20. Já percebi que vou gostar tanto do segundo como do primeiro. Ambos me tentam – como tantos outros - a voltar à estrada. Às rectas sem fim da Patagónia, ou às picadas de terra cor de tijolo do Príncipe, ou às auto-estradas do Dakota do Norte, ou aos estreitos caminhos de cimento de uma pequena ilha de pescadores ao largo de Hong Kong.

Uma das minhas estradas preferidas é a chilena nº 255 - os 210 quilómetros de alcatrão que vão de "Paso de la Frontera", na fronteira com a Argentina, até à cidade de Punta Arenas. Aberta às ventanias, segue a margem Norte do estreito de Magalhães, acompanhada por rebanhos de ovelhas pastando ao longe, passando pelas carcaças do “Ambassador” e do “Amadeo” encalhados numa pequena praia de seixos rolados, assombrada numa curva larga pela central de petróleo e gás natural da Empresa Nacional de Petróleo, num lugar que dá pelo nome, nem de propósito, de Posesión. Há quem chame à Patagónia o fim do mundo. Outros, o princípio do mundo. Ao longo desta estrada, desenrola-se uma das paisagens mais desoladas do mundo, certamente. E um belo esconderijo de histórias, de personagens, de boas e más aventuras. O que me leva aos livros de outro escritor chileno, Francisco Coloane (1910-2002), que descreve como ninguém os homens, o mar e as paisagens deste Sul do mundo. Vale a pena entregarmos viagens em mãos assim. De Coloane a Allende.

Hoje, por sinal, estou na estrada. Curta - só até Leiria. Sem saco e com regresso marcado. Mas sempre é melhor do que mais um dia a uma secretária.

Acessórios de leitura

Um filme
“Trailer” do filme “Diários de Che Guevara”. Vale a pena ver ou rever esta viagem de dois amigos, de mota, ao longo de oito meses e 14 mil quilómetros, pela América do Sul. Chile e Patagónia incluídos.




Uma palestra
Isabel Allende sobre a escrita e as mulheres.




Antes que me esqueça

O “clip” publicitário ao turismo moçambicano estreou mesmo esta semana em Londres, no World Travel Market. Uma pequena parte já pode ser vista em http://www.stellamendonca.com/paradise.html

Mónica Bello

2 comentários:

Anónimo disse...

Há dias assim,
em que apetece por o pé na estrada, e sair sem destino ou relógio, ir...

de livro e pensamentos debaixo do braço,
ir até apetecer parar e ficar, até apetecer voltar...

Anónimo disse...

Inesquecível a estrada chilena nº. 255, a sugerir mistério, aventura e personagens estranhas.
Inevitavelmente a evocar a personagem de génio-semi-louco de um tal Alphonso, um fim de tarde gélido, uma árdua recolha de milhares de ovelhas e a aventura numa anti-estrada no interior da Estância.
A sul com a norte da 255 há seguramente muitos mistérios!
De resto,grandes sugestões!

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