Há algumas semanas largas (este post foi escrito em 2017] escrevi sobre Fátima, sobre a canonização dos pastorinhos, sobre a minha não devoção aos santos. De lá para cá muito se tem escrito sobre o tema, com posições mais ou menos radicais de gente do clero que é apelidada de comunista ou de maçon. Não sei se são, nem isso interessa para o tema em apreço.
A minha ideia de Fátima mantém-se igual: o milagre que ali se opera, de há 100 anos para cá, não é a aparição de Nossa Senhora ou a visão que três crianças tiveram de Nossa Senhora. O milagre é a mudança, o apelo à mudança - talvez mesmo o desejo de mudança. O milagre é o conforto que todos temos, independentemente das superstições, das fés menos esclarecidas, de uma espécie de auto-flagelo que supostamente conforta o coração ofendido de Deus, como se Alguém que não é senão amor se ofendesse com o que quer que seja... O milagre é uma espécie de irmandade universal, de compreensão pela angústia de quem está ao nosso lado e cuja vida desconhecemos, de partilha da alegria de outra pessoa, noutro lado, e cuja vida desconhecemos também.
Fui a Fátima hoje, mas há 16 anos, ano de todos os anos. Vi a imagem de Nossa Senhora a uns metros de mim, mas Nossa Senhora não estava ali. Estava no meu coração, no coração de quem, pequeno e indefeso, lutava uma luta cedo de mais. Estava no coração de todos os que me acompanharam, sobretudo os mais próximos de entre os mais próximos. Nossa Senhora não é uma imagem; a imagem é apenas a materialização para onde podemos olhar com os olhos de ver, porque os olhos que sentem estão voltados para o infinito, para a alma, para o interior dos que sofrem ou dos que se alegram. Olhamos na horizontal para podermos olhar na vertical - os olhos no andor, os olhos no céu. E dizer-lhe adeus não é dizer-lhe adeus, mas é empunhar uma vela que fica acesa sempre, porque todos os dias são dias de pedir e de agradecer discernimento e força, que com isso alcançamos o mundo.
Por diversos motivos não irei a Fátima neste dia 12 de Maio. Talvez me comova pela televisão, porque hoje, mas há 16 anos, lá fui pela primeira vez, ano de todos os anos. Talvez me comova percebendo tudo o que ganhei, apesar de tudo o que perdi.
JdB
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* publicado originalmente a 12 de Maio de 2017
1 comentário:
Gostei (muito) de reler.
Grande abraço,
fq
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