Estive, há 2 semanas, numa reunião do Board da associação a que pertenço, a Childhood Cancer International. Somos 9 ao todo, vindos de toda a parte: do Chile, da Malásia, da Índia, da Austrália, da África do Sul e do Zimbabwe, de Espanha e da Suíça, da Nova Zelândia. Por razões pessoais não estivemos todos presentes.
Trabalho de perto (o que quer que isso queira dizer, em tempos pandémicos) com alguns deles, vou-lhes conhecendo as vidas, os feitios, as disponibilidades. Ora, com pelo menos três nunca tinha estado cara a cara; e havia pessoas que nunca tinham estado com ninguém daqueles que iriam encontrar em Viena. E no entanto reunimo-nos uma vez por mês - pelo menos.
Após tanto tempo de isolamento e reuniões virtuais, um encontro presencial faz milagres: num instante abraçamo-nos, bebemos vinho ou cerveja enquanto falamos alto, contamos histórias e rimo-nos como se nos conhecêssemos há muito tempo. Não vou explicar - porque não quero ser maçador - os benefícios de um encontro destes para o espírito de equipa, para o trabalho em conjunto, para o processo de tomada de decisão. 2 dias fazem milagres.
Há muito que estou habituado a estes encontros internacionais onde todos falamos a mesma linguagem, onde a egípcia dança com o israelita, o russo com a americana e todos se abraçam e fazem festa como se fossem famílias separadas à nascença. É uma comunidade maioritariamente de pais / mães de crianças com cancro, que perderam filhos, que os mantêm por perto, por quem mantém uma atenção desmedida, porque nunca se sabe o que pode acontecer com uma pneumonia ou uma infecção. É uma comunidade que comove, diria eu.
Nos tempos pré-pandemia as pessoas encontravam-se uma ou duas vezes por ano e / ou comunicavam por correio electrónico, sendo que por esta última via não se conhecia ninguém. Com o advento do zoom passámos a conhecer-nos em formato tipo passe - sabemos, no fundo, o que se passa do pescoço para cima. Um dia, numa reunião virtual com médicos, celebrando todos o facto de podermos encontrar-nos presencialmente em Barcelona, houve um médico australiano que se sentiu na necessidade de dizer: gostava de informar que sou mais baixo do que pareço no zoom. No dia em que me encontrei com colegas do Board no hotel houve uma ou duas pessoas que me disseram: achei que eras mais baixo...; talvez tenham dito a outro que parecia mais alto.
Passei a vida de ouvinte de telefonia e imaginar o corpo e a cara dos locutores, a colar uma voz a um físico, sem que o exercício obedecesse a qualquer critério científico. Agora resta-nos imaginar uma altura a partir de um retrato do tipo passe. Parece-me um exercício menos interessante.
JdB
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