18 janeiro 2016

Da África

Fotografia de Hugo Firx

Quem me segue neste estabelecimento ou na vida sabe que em 2008 vivi dois meses no Zimbabwe. Antes disso, o meu conhecimento da África subsariana limitava-se a uns dias em Pretória, corria o ano de 1981... A estadia no império de Mugabe causou-me uma impressão que não desaparecerá. E não foram só as condições em que parti e em que lá vivi. Por outro lado, não é a primeira vez que alguém me diz: gostava de voltar a viver em África ou que revela uma emoção grande pelos tempos em que lá viveu, normalmente na juventude.

Um destes dias dei por mim a pensar no que me atraíra tanto em África. Teria sentido o mesmo se tivesse vivido nas mesmas circunstâncias, mas na Finlândia? Ou na Nova Zelândia? Ou no Rio de Janeiro? Quando eu digo "mesmas circunstâncias" falo nos motivos que me levaram a partir, nas condições em que lá vivi, nas oportunidades que me foram dadas de conhecer gente diferente e locais diferentes. As memórias gozosas que perduram são independentes do local? Vietname ou Londres seriam iguais?

Talvez por isso tenha perguntado, a quem um dia me disse que gostaria de lá viver de novo, o que provocava tanto frisson na vida em África. A resposta foi directa: a simplicidade, a genuinidade, o à-vontade, o clima, as pessoas. Depois olhei para dentro de mim próprio, para o entusiasmo com que lá vivera e com que recordava a experiência e, pese embora algumas diferenças, revi-me muito na resposta que me deram.

Sou um homem globalmente formal, conservador, com uma visão por vezes rígida de hábitos, comportamentos, formas de estar. Não falo de princípios morais ou éticos, mas da formalidade do dia a dia: forma de vestir, fórmulas linguísticas ou de estar à mesa, regras de respeito pelas senhoras ou pelos mais velhos. Não vivo infeliz no cumprimento destes códigos. E, não obstante, a ideia da simplicidade, do à-vontade, da genuinidade atrai-me. Atrai-me a mim como atrai outras pessoas. mPor outro lado, quantos de nós põem uma máscara em sociedade com que vivem aparentemente felizes: a máscara do sucesso, da felicidade, dos bens materiais, de tantas coisas?

Talvez África seja um mistério. Ou talvez o mistério sejamos nós, que colaboramos num modo de vida europeu, ou ocidental, de que queremos fugir volta e meia. Ou para sempre, numa visão mais radical.

JdB

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