Não há um músculo do meu corpo ou do meu cérebro que se mova para uma análise política às eleições deste domingo. Não vou analisar o perfil dos abstencionistas nem a transferência de votos deste partido para aquele partido. Não vou falar do que me deu satisfação, porque talvez nada me tenha dado satisfação.
Fui militante do CDS nos primeiros anos da sua existência. Fiz parte de uma equipa que garantiria a segurança no comício da juventude popular em 4 de Novembro de 1974, no Teatro S. Luís; passei um 1º de Maio na sede do CDS à espera de vê-la invadida; fiz parte da primeira equipa que colou cartazes do CDS e pintou frases políticas na praça do Giraldo, em Évora (algo muito pouco civilizado, numa praça tão bonita; com uma mão pintava-se, com a outra segurava-se uma matraca, para a eventualidade...); fiz militância política em Cascais e no Liceu de S. João do Estoril contra a UEC, onde dei e levei encontrões. Tinha 16 ou 18 anos e tudo era emocionante e claro, sabíamos quem estava do nosso lado e quem não estava.
Ver o CDS desaparecer é uma facada nas minhas memórias e na minha confiança no futuro parlamentar. O desaparecimento do CDS entristece-me, por motivos que já aqui expliquei antes das eleições. Entristece-me saber que, se PSD e CDS tivessem ido coligados, talvez o PS não tivesse maioria absoluta (embora talvez criasse uma eco-geringonça, que não sei se não seria pior, dadas as cedências que teria de fazer). Entristece-me não perceber quem tem razão na contenda interna que deu origem a um autêntico lavar de roupa suja em praça pública: são os chamados "portistas" (tenho consideração por alguns) ou é o presidente do partido? Entristece-me ter visto aquele abandono público de pessoas que eu achava que deviam fazer mais, ou melhor - nomeadamente Cecília Meireles e António Pires de Lima. Entristece-me, porque não dizê-lo, ver um rapaz, Francisco Rodrigues dos Santos começar e acabar (previsivelmente) uma carreira política aos trinta e poucos anos, escrevendo no seu CV uma responsabilidade grande (ou a maior) pelo desaparecimento do CDS.
Tudo me entristece, nomeadamente a eleição de Rui Tavares ou de Inês Sousa Real. Ainda que irrelevantes para a governação do país, podem dizer, nos poucos minutos que lhes serão atribuídos, que querem o domínio vegan ou que o país deve pedir desculpa pelos descobrimentos. No outro lado da barricada já não haverá ninguém, dotado de um sentimento cristão, a levantar-se contra a eutanásia ou contra as aulas de Cidadania, ou a dizer que a prisão perpétua é uma aberração porque cada pessoa é maior do que o seu erro.
Tudo me entristece menos o Sporting, que averbou uma excelente vitória contra o adversário tradicional.
JdB
2 comentários:
Pois... embora prefira a maioria absoluta destes senhores a concessões a extremistas (BE) - o PC já não risca desde a queda da URSS - e fanáticos (PAN), a minha relação com este povo continua como sempre: amor-ódio. Percebo lindamente o que diz. Desde os 18 anos que votava CDS, embora tenha começado a andar por lá aos 13. Agora, optei pela IL. Dado que sou religioso, mas não me considero católico (a formação é), a prisão perpétua e a eutanásia não me fazem grande confusão (a eutanásia a mando consciente de quem se quer matar e não as outras que por aí se falam). Quanto às aulas de cidadania como estão, corridas de touros, caça, pesca, ter liberdade de ser hominívoro, concordo em absoluto consigo. O CDS foi grande parte da minha juventude, embora o Partido do Progresso tenha sido o meu ex-libris político nessa época e numa "juventude muito jovem", lodo a seguir ao 25 de Abril, até porque a questão do Ultramar me preocupava. Mas a seguir veio o CDS com o Manuel Monteiro na Juventude Centrista e eu, que nunca fui do centro, alinhei. Depois, foram altos e baixos, mas nunca deixei de votar naquele CDS que, nos últimos tempos, deveu ao Paulo Portas ter crescido de forma a impor as suas ideias. É curioso que o Passos Coelho governou segundo uma linha coincidente com o CDS da altura preconizava. Por outro lado, o CDS incorporava conservadores, democratas-cristãos e liberais, aglutinados numa espécie de “frente” anti-socialista. Gostei de andar por lá, até porque me revia em muitas das opções tomadas. Mas, de repente, o Paulo Portas sai e mais tarde aparece um partido (que já tinha existido, mas tinha sido extinto em 1974-75) que começou a falar uma linguagem que eu entendo e que quer dar aos cidadãos possibilidade de escolha sem impor, pretendendo somente gerir a sociedade, sem interferir muito. Gostei, embora haja coisas que nos dividem e, se calhar, muito. Quanto ao CDS, embora o Francisco Rodrigues dos Santos tenha feito uma boa campanha, foi sempre poucochinho, tendo às vezes raiado a personagem de pastor da igreja maná, à semelhança de um senhor de seu nome Ventura - o Chega, em abono da verdade, tem 1% de gente que pensa e 99% de gente que está ali, como poderia estar no BE ou numa qualquer claque de futebol. Mas o seu sentimento em relação ao CDS é o mesmo que o meu. É parte de uma vida que vejo partir, penso, definitivamente.
Obrigado pelo seu comentário - diria pelo seu testemunho.
Percebo a escolha da IL - mas são a favor da eutanásia, da legalização da prostituição, não sei se têm opinião muito forte sobre o mundo rural, foram envergonhados com as corridas de touros...
Enfim, é o que é. Esperam-nos 4 anos de monocromatismo.
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