10 agosto 2016

Jogos Olímpicos - a visão de uma colectividade *



Os Jogos Olímpicos de Pequim [ver nota no fim da página] estão na sua recta final. Para a delegação portuguesa, com algumas honrosas excepções, não há euforia na Portela, vislumbra-se já a curva da estrada. Estou certo de que comungaremos todos do mesmo sentimento: desilusão. Não faremos com certeza o V da vitória, mas, se o despudor nos impelir a isso, haja uma alma caridosa que pendure as medalhas alcançadas nos dedos espetados. Sobra um dedo? Mas que maçada…

Não me parece que a culpa seja dos atletas, da falta de profissionalismo, da fatalidade das provas matinais para quem gosta do quente da cama, da penúria indigente em que nos encontramos, da falta de resistência à tensão competitiva. Há um problema de base que faz ruir a visão da bandeira hasteada, a audição do hino nacional expurgado do carácter marcial e transformado numa sinfonia pastoral. O problema está na escolha das modalidades nas quais teremos representantes. Estou certo disso, e a certeza instala-se em mim com uma convicção que pode ser incomodativa.

O País não está preparado para me ouvir (não levo a mal a impreparação) mas eu faria as coisas Jogo Olímpico a Jogo Olímpico. Eu explico: as modalidades medalhadas em Pequim ganhariam o estatuto de representação em Londres. As outras seriam riscadas ferozmente do Plano Desportivo Nacional.

(Neste momento apostamos no triatlo feminino, o que se me afigura económico).

Era imperioso que duas outras modalidades tivessem o total empenho do Governo, dos Clubes, das Autarquias – afinal, os grandes responsáveis pelo nosso desaire desportivo. Quais seriam? O bilhar e o ping pong, que os intelectuais do desporto chamam ténis de mesa. Porquê estes? Porque são os verdadeiramente praticados nas colectividades, ramo da economia onde somos fortíssimos. Há por esse país fora – na sua pluralidade geográfica, incluindo os arquipélagos – um manancial de talentos que investe horas no taco ou na raqueta, procurando o melhor efeito para esmagar o oponente. É gente que não carece de grandes patrocínios ou subsídios, que entrega a camisa à Pátria em troca de uma fanta laranja ou de uma imperial bem tirada.

Damo-nos mal com o estatuto de alta competição, embora o chapéu que alguns atletas usaram no desfile de abertura não ajude à moral. Criamos uma exagerada expectativa que, como se sabe, é a mãe da desilusão. Há almoços com o presidente da república, programas nos canais generalistas, conversas com a população local. Os atletas nacionais afadigam-se num corropio entusiasmante de entrevistas, fotografias, conversas informais, dissecação das biografias, informação sobre os gostos pessoais. Enquanto isto, os outros treinam - só assim se compreende que a poderosa Mongólia, o competitivo Uzbequistão e os entusiasmantes Camarões estejam à nossa frente no ranking. A nossa liga é a dos últimos, mas sabemos que há atletas lusos que elegem o passeio e o convívio com os amigos como actividades lúdicas importantes.

Não me alongo, que tenho ali uma juventude à minha espera para um torneio solidário de bilhar. É malta local que já vislumbra o Big Ben daqui por quatro anos – assim haja vontade política de mudança. Alertam-me para algo importante: estamos habituados à simplicidade deste jogo, pelo que as três tabelas só são obrigatórias para o último ponto. Tudo o resto é singelo – bola na bola na bola com opção facultativa de tabela .

A música de Verão de 2012 será A Portuguesa. Duvidam?

JdB

* Publicado originalmente a 20.08.2008. Será que esta visão é aplicável aos jogos olímpicos do Rio?

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