11 dezembro 2009

outra vez, a alegria

um amigo de paz e de bar
a gente basta olhar
(que às vezes
falar só atrapalha:
a gente estendendo a toalha
e só cai essa migalha.)

com um amigo de paz e de bar
isso não acontece não,
a gente basta olhar
e o dia, até aí sujo (imundo?),
vai de mansinho ao fundo
e volta p'ra gente,
branquinho como nunca
de tanto clarear.

amigo de bar e de paz
é coisa fina, preciosa,
jóia rara, milagre,
a única coisa do mundo,
para não mudar de assunto,
que apetece guardar.

sabe, rapariga,
me escute, seu rapaz,
eu quando vejo
um amigo de paz e de bar
fico doce de emoção,
(mas, sabe, sem sofreguidão,
sabe, sem me magoar.)

desejo até a eternidade,
veja só, pode isso ser?,
e assim a morte,
o desamor,
a falta de talento
ou de sorte,
tudo isso inteirinho
fica bem lá para trás,
longe do coração meu
e da cidade.

é assim, me escute com atenção
(um polaroid para recordar):
e eu e o meu amigo
olhando o mundo,
através da vidraça de um bar,
somos como esses meninos do rio
mirando longe o casario.
e o olhar límpido volta,
reflectido no copo,
e puro estala o coração,
cá dentro, a crepitar.

eterna constelação:
amigo, paz, bar
uma espécie de redenção
que faz a gente lutar,
e outra vez acreditar
no amanhecer
de um novo dia.
que faz a gente ousar
(e usar e abusar)

outra vez, a alegria.


gi.

2 comentários:

Anónimo disse...

Muito bonito. A certa altura lembrou-me um quadro do Hopper: um bar, noite, uma janela e umas pessoas, poucas, sentadas a uma mesa. Mas o seu poema é mais luminoso. Tem esperança. Os quadros do Hopper não... pcp

Anónimo disse...

olá, pcp.
muito obrigado pelas suas palavras e pelo seu apreço.
curioso: hopper é um dos meus pintores preferidos, precisamente pelo lado que refere: capta um certo 'mal de vivre' moderno, sem 'angst', apenas e só a placidez vazia da vida suspensa. diria que a minha poesia, em regra, vai ao encontro desse tipo de 'sentimentos'. por isso mesmo, achei muito curiosa a sua referência a uma espécie de hopper revisitado e improvável - 'um hopper com esperança'.
diria assim: a prova provada de que toda a obra humana encerra em si um permanente diálogo entre um lado mais solar e uma face mais lunar.
uma vez mais, obrigado.
flores matinais,

gi.

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