18 junho 2010

amor & etc.

repara, laura, nas minhas palavras,
uma hipótese entre tantas outras de seres feliz
pela linguagem.

aqui, neste bairro que só nós dois habitamos,
nenhum linguista ousará desfazer
os nós entrelaçados dos nossos dedos;
nenhum filologista romperá jamais
os elos, os laços, os traços
que nos unem
e reúnem
à volta da enorme árvore frondosa da praça maior:
a linguagem.

de alexandre dito o grande, restam os livros.
de roma, outro tanto.
alexandria, sião, constantinopla?
poeiras
varridas pelo tempo.

já as palavras teimam, insistem, resistem.

como esta minha ideia louca, laura,
de te fazer feliz
por pura osmose semântica.

um dia, alguém lerá: foram felizes, tão felizes, aqueles dois.
e sabes que mais, laura?
no espaço destas exactas 28 linhas mal escanhoadas,
descontando já as linhas brancas,
sei que
fomos fomos fomos fomos

- isto é: sei que somos.

gi.

2 comentários:

Maf disse...

Ai que belezura de poema. Este,sim, entendi-o todinho, talvez porque fala de amor, sei lá! Confesso, Gi, que nem sempre entendo o que escreve e sinto-me ignorante, insensível. Mas hoje, ao lê-lo, senti-me quase Laura :-)
Thks
Maf

Anónimo disse...

Olá, Laura - perdão, Maf.
Muito obrigado. Nem sempre a poesia tem uma interpretação directa e literal, ao contrário do que muitas vezes se pensa. Escreve-se sempre para os outros e para nós próprios - razão bastante para que parte do 'enigma semântico' fique sempre, e para sempre, na posse do autor. Mas, claro, a escrita faz mais sentido quando vai ao encontro do leitor e, de certa maneira, é capaz de suscitar uma reacção, seja ela empática, projectiva ou, pelo contrário, no sentido da rejeição. E tudo isto vale tanto para a dimensão estética (como se escreve) como ética (o que se escreve). Neste caso, o poema fala de amor. E fala da importância da linguagem em todos os actos humanos. Há nele como que a construção de uma utopia amorosa, extirpada da sua dimensão material e temporal. O amor como ideia, grafado através da linguagem. Como disse um filósofo 'poesia é guerra'. E, acrescento eu, o amor também. Mas uma guerra metafísica, em busca de sentido e de paz.
Laura existe e não existe. Todos somos Laura. E Laura também sou eu. E é ainda A mulher - todas as mulheres -, tal como retratada no filme 'Laura', de Otto Preminger. Uma morta-viva que atormenta o detective da história. Uma ideia 'feroz' de um amor puro, porque impossível - logo não sujeito às armadilhas do espaço e do tempo.
Complexo? Porventura. E a vida, é-o menos?
Termino como comecei: muito obrigado.
Flores matinais, para si, leitora,

gi.

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