09 fevereiro 2015

Vai um gin do Peter’s?

Há tempo veio na revista do Expresso(1), uma entrevista com o homem mais feliz do mundo – Matthieu Ricard (1946-…) segundo os estudos de um grupo de neurocientistas ocidentais, que ficaram impressionados com os resultados hiper positivos revelados nas múltiplas medições à sua actividade cerebral.

Curiosamente, a infância e todo o sucesso profissional de Matthieu pareciam tê-lo fadado para ser feliz no Primeiro Mundo, onde tivera a sorte de nascer, um ano depois de acabar a Segunda Guerra. Mas, afinal, foi a sua reviravolta na vida que fez a diferença e o colocou na pole position da felicidade… tanto quanto se pode monitorizá-la e quantificá-la por sensores de laboratório.

Oriundo do melhor meio intelectual francês, conheceu Stravinsky (fugido à Rússia bolchevique) e Cartier-Bresson. Na ciência, chegou rapidamente ao topo da carreira, doutorando-se em Biologia Molecular e colaborando com o Nobel da Medicina – François Jacob. Este convívio de luxo levou-o a descobrir que a erudição científica e artística estavam longe de conferir estatura humana! «Grandes génios… pequenos nas qualidades humanas».

Cumprindo tudo o que se podia esperar de um jovem cientista com futuro, percebeu quanto fazer carreira lhe era insuficiente. Limitado. Quer a Cidade das Luzes, quer a elite a que pertencia, sabiam-lhe a pouco.

Assim, partiu para os Himalaias (1972), onde se tornou monge budista e aprendeu a olhar a realidade, os outros, numa perspectiva nova. Começou a encarar a vida de uma maneira que revolucionou a sua existência. Despojada. Mais autêntica. Sobretudo, recuperou o sabor! Aquele salero que nos aproxima da felicidade.


Garante que «Mudar só depende de nós». Mas não se confunda felicidade com prazer – lembra. E explica melhor: «Não há mal nenhum no prazer. Mas o prazer não tem nada a ver com felicidade… (Um exemplo:) a música alto. Um bocadinho é bom, 24 horas pode ser tortura. Aliás, é um dos métodos usados em Guantánamo. Viver só de prazer deixa-nos exaustos. A felicidade é uma forma de estar na vida, não é apenas uma sensação momentânea.»

O seu sorriso aberto e sereno transmite paz e harmonia interiores. As suas respostas simples e profundas são de uma sabedoria incrível, que simplifica sem simplismos. Com a simplicidade dos sábios. De facto, quando se chega a discernir o essencial, tudo o resto se reordena rapidamente, com realismo e consistência.

No coração dos Himalaias, fica-se, em todos os sentidos, mais perto do céu… 

De um humor doce, desmistifica, de modo cristalino, aquele equívoco muito em moda, de temer que haja vaidade ou egoísmo encapotados em certos comportamentos altruístas… Esclarecedor, dissipa quaisquer dúvidas: «Se alguém fizer alguma coisa de bem ao outro só porque se quer sentir bem, então isso não é sequer ser altruísta. Duvido até que se sinta mesmo bem ao fazê-lo. Mas, se olharmos para o nosso dia a dia, há muitos gestos altruístas, nós é que temos tendência para os subestimar      

Com a autoridade de quem parece corresponder ao que testemunha, Matthieu aponta as prioridades, sugerindo uma bússola: «Essenciais são a amizade, a paz, a sensação de ter o coração cheio, de que cada momento vale mesmo a pena ser vivido. Está mais do que estudado que, quanto maior o consumismo, menor é a felicidade que se alcança. (…) Primeiro, devemos olhar para dentro e ver o que nos proporciona felicidade. Como o amor altruísta, por exemplo. É preciso controlar o excesso de desejo. E como o fazemos? Simples: libertando-nos dessa ansiedade de querer ter tudo. Como é que dissipamos a raiva? Com amor, afeição. (…) Se quer ser feliz pratique a compaixão

A sua definição de felicidade: «By happiness I mean here a deep sense of flourishing that arises from an exceptionally healthy mind. This is not a mere pleasurable feeling, a fleeting emotion, or a mood, but an optimal state of being. Happiness is also a way of interpreting the world, since while it may be difficult to change the world, it is always possible to change the way we look at it.» (extraído do seu blog: http://www.matthieuricard.org/en/index.php/blog/)

Na sua prioridade de vida, a ajuda ao próximo preenche por inteiro o seu dia: «Our happiness depends on that of others. To love oneself is to love life. It is essential to understand that we make ourselves happy in making others happy

Matthieu Ricard é o responsável pela associação sem fins lucrativos Karuna-Shechen,
que acolhe doentes, idosos e crianças, ministrando-lhes cuidados médicos, apoio e  educação escolar. 

Será que faz sentido ficar à espera da Primavera e do bom tempo para ser felizes? O testemunho refrescante de Mathieu sugere que tudo se decide no nosso coração e na nossa cabeça, reiterando o que diziam Audrey Hepburn, a Madre Teresa e tantos outros. Ainda bem que nos cabe a nós escolher se serão as condições metereológicas (ou quaisquer outras) a ter a última palavra…

Maria Zarco
(a preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2 semanas)

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(1) De 28 de Abril de 2012.

     «Happiness. A Guide to Developing Life's Most Important Skill», by Matthieu Ricard. 304 pages. Little, Brown & Co.

«In brief, the goal of life is a deep state of well-being and wisdom at all moments, accompanied by love for every being, and not by that individual love that modern society relentlessly drums into us. True happiness arises from the essential goodness that wholeheartedly desires everyone to find meaning in their lives. It is a love that is always available, without showiness or self-interest. The immutable simplicity of a good heart.»

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