03 janeiro 2014

Das coisas mantidas ou abdicadas

gr 20.10.2013 (fotografia de JMAC, o homem de Azeitão)


O tema é recorrente, tanto nos meus solilóquios como nos diálogos que mantenho com quem se alimenta de paciência. Acresce que encontrei este tema levantado num blogue que costumo frequentar. Ao contrário de outros textos semelhantes neste espaço, não usarei nunca a expressão despojamento, porque lhe dou uma conotação diferente daquela que me motiva agora.

A crise atacou a concretização dos nossos desejos, porque afectou o nosso poder de compra. Vejo gente com carros piores, com carros nenhuns, sem empregos ou remetendo os períodos de férias para as casas dos amigos ou para as praias vizinhas. Muitos de nós jantam menos fora, compram menos livros, menos roupa; muitos deixaram de viajar; muitos, ainda, passaram a ser mais comedidos em casa, aproveitando restos, racionalizando (que é diferente de racionar) a comida. 

Satisfeitas as nossas necessidades básicas -  não passar fome nem sede, não sofrer excessivamente com o frio ou o calor, ter um tecto onde se refugiar - o que nos falta? Isto é, o que são os nossos desejos que estão para além do que é natural e necessário? O que é verdadeiramente supérfluo na nossa vida, mas que o nosso percurso tornou natural ou necessário, como ler, viajar, ter um carro, comprar roupa por prazer?

Uma parte substantiva dos meus amigos vive com menos. Uma parte grande vive com muito menos. E no entanto, (quase) todos dizem que vivem bastante bem com bastante menos, prova evidente de que as suas vidas (e a minha também) estavam carregada de coisas (bens materiais ou hábitos) que não eram verdadeiramente necessários. 

Desde há muito que penso e desafio outros ao mesmo pensamento: de que podemos dispor até nos considerarmos "pobres", ou até considerarmos que a qualidade da nossa vida decresceu além do razoável? É o carro? É o deixarmos de ir à neve? É deixar de comprar livros ou discos? É comer menos ou é mudar para uma casa num bairro menos bom? No fundo, no fundo, do que poderíamos prescindir e, mesmo assim, dizermos que somos felizes?

De que se compõe, verdadeiramente, a nossa felicidade?

JdB

1 comentário:

Anónimo disse...

«Why is it that things have assumed such an immense importance in our lives? Why is it that things, property, houses, clothes, and so on, take such a dominant place in our lives? Is it because we merely need them, or is it that we depend upon them for our psychological happiness? We all need clothes, food, and shelter. This is obvious. But why is it that they have assumed such tremendous importance, significance? Things assume such disproportionate value and significance because we psychologically depend on them for our well being. They feed our vanity; they give us social prestige; they give us the means for procuring power. We use them in order to achieve purposes other than what they in themselves signify. We need food, clothes, shelter, which is natural and not perverting, but when we depend upon things for our gratification, when things become psychological necessities, they assume an altogether disproportionate value and importance, and hence the struggle and conflict to possess, and the various means to hold those things upon which we depend.»

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