24 janeiro 2014

Dos aviões

6ª feira passada, faz hoje uma semana. De Bicesse ao aeroporto, ainda não eram dez da manhã, a viagem demorou uma hora e trinta. Era o temporal, as batidas na A5, o granizo na Buraca, a neve em Benfica, a chuva e o piso molhado. O vôo da Easyjet para o Funchal era às 11.30h, a porta fechava às 11 horas. Como chegámos ao terminal 2 pelas 11.15h, a probabilidade de embarque era baixa. Mesmo assim conseguimos, que tudo estava atrasado.

Voo quase cheio. Íamos numa fiada de três bancos, ocupando a janela e o meio. Ao lado, junto ao corredor, uma rapariga magra e sossegada, o que augurava menos aperto. Mesmo assim estranhei que, havendo a duas filas uma fiada idêntica só ocupada por um passageiro, não sugerisse mudar de local. Ela não perdia e nós ganhávamos. Mas não manifestou vontade, apesar de eu sugerir a hipótese num tom de voz suficientemente alto.

Chegámos ao céu do Funchal. Poços de ar, vento, vento, vento. Fizemos uma primeira aproximação, borregada devido ao vendaval. Informação do chefe de cabine e do piloto de que o vento soprava a uma velocidade superior ao valor limite estipulado por lei para aterragens, pelo que aguardaríamos dez minutos antes de tentar de novo. 

É nessa altura que o passageiro atrás de nós pede que façamos chegar ao comandante uma folha de papel, tipo saco de talheres amarrotado. Nele estava escrito CANÁRIA (sic) e umas letras indecifráveis abaixo. Isto é - o cavalheiro, que aparentemente era um piloto, fazia chegar ao comandante de uma companhia de aviação que opera na UE um papelinho a sugerir rotas alternativas. Questiono-me o que imaginaria este passageiro. Que no cockpit a alegria da tripulação fosse imensa, porque a ninguém tinha ocorrido as Canárias? Que ele fosse chamado para tentar também, como quem está na Feira Popular?

Nova tentativa, novo falhanço. O passageiro atrás inquiria pelo papelinho, certo de que a solução do voo estaria ali, naquela singela mas tocante mensagem. Fomos informados então de que regressaríamos a Lisboa. 

30 minutos depois recolhia-se o lixo. À hospedeira, simpática e com um friso de dentes metalizados que me estendia um saco, disse amavelmente que tudo ia para o lixo, até a viagem. Ela sorriu, e disse-me esta frase enigmática: veja pelo lado positivo...  A mim, que sou um pessimista ferrenho e convicto, só me ocorreu perguntar (o que fiz): e qual é esse lado positivo, pois perdi (até que a substitua) uma viagem que tinha planeado não vislumbrando nada em troca? Sinto que ela suspirou brevemente, que o metalizado dos dentes se oxidou um tudo nada. Sei que olhou para mim e seguiu, vencida pelo esmagamento de uma pergunta à qual nem o optimismo mais feroz salva.

Restos da refeição no regresso a Lisboa. O letreiro augura um ano novo saudável, mas a chapata (é assim que se escreve?) era mais dura e seca que sola de sapato. Como diria uma passageira divertida: fly easyjet - it's easy to come back...


JdB   

1 comentário:

arit netoj disse...

Que frustração! Pelo menos já a superou com este texto...
Beijinhos

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