Num artigo recente, um professor do Técnico trouxe
a lume o caso insólito de um negativo muito anterior à invenção da fotografia
que data de meados do século XIX. Ora este negativo conta com 2000 anos. Como
se fosse pouco, ainda soma a proeza de continuar a sobreviver ao tempo,
incólume, o que não acontece com muitos dos que têm perto de 100 anos.
Sabemos que há casos por desvendar no património
histórico e artístico da humanidade, como as gigantescas estátuas da Ilha de
Páscoa ou os geoglifos do deserto de Nazca no Peru, igualmente desmesurados. Só
que o tal negativo com vinte séculos mantém uma estranha actualidade,
interferindo com o dia-a-dia de muita gente, como atesta o testemunho postado
no final deste gin, de uma iraquiana de apenas 10 anos, acolhida num campo de
refugiados.
Começando pelo artigo, gentilmente cedido pelo
autor, José Maria André recorda um fenómeno com características únicas e algo
insólitas:
Uma
fotografia com 2000 anos
Existe na
cidade de Turim um grande lençol com uma imagem em negativo. Há 20 anos atrás,
ninguém se admiraria com isso, porque era comum as máquinas fotográficas
tirarem a fotografia em negativo e depois esse negativo ser passado para papel,
produzindo o negativo-do-negativo, ou seja, a fotografia positiva, a preto e
branco. Hoje em dia, só os idosos se lembram dos negativos. As fotografias
digitais já não passam por essa etapa intermédia e os mais novos só conhecem
imagens negativas obtidas no computador. Na história da humanidade, a época dos
negativos fotográficos durou apenas uns cem anos. Até há pouco mais de um
século, ninguém tinha visto um negativo e, actualmente, os negativos voltaram a
ser raridades.
O curioso
é que o grande lençol de Turim tem muitos séculos. A maior parte dos
especialistas atribui-lhe 20 séculos e o mínimo de idade que lhe atribuem é 10
séculos. Como é que alguém se lembrou de fabricar uma imagem em negativo há
tantos séculos atrás?
Outra
característica pouco vulgar do lençol é ser uma imagem a preto e branco.
Tirando os painéis de azulejo, as pinturas são quase sempre coloridas. Porque é
que alguém fez uma pintura em tons de cinzento, em vez de um quadro a cores?
O lençol
de Turim tem ainda outras complexidades. É quase uma pintura abstracta, não uma
pintura decorativa, mas um amontoado de manchas que não se percebe bem à
primeira vista. Arte semi-abstracta há 20 séculos?
A imagem
do lençol de Turim não tem sinais de pincel ou de tinta, é um conjunto suave de
manchas, como as fotografias. Que técnica de pintura tão estranha, há 20
séculos, que hoje ainda não se consegue imitar!
Além
disso, o lençol está sujo de sangue. Alguém usou o lençol para limpar o sangue
de uma pessoa ferida? Se é uma imagem tão valiosa, guardada com tanto cuidado,
durante tantos séculos, porque é que nunca lavaram o lençol?
As
investigações sobre este lençol destacaram muitas outras particularidades. As
fibras de linho são típicas da Palestina de há 20 séculos e o entrançado do
tecido é característico dessa região. Por entre as fibras, encontraram-se
poeiras e grãos de pólen sobretudo de plantas típicas da Palestina e de algumas
outras terras por onde o lençol andou.
Há
documentos muito antigos que contam que aquele lençol envolveu o corpo morto de
Jesus Cristo e por essa razão, embora não seja um tecido rico, foi guardado com
tanto cuidado até hoje. Ao longo destes séculos, o lençol passou por diversas
mãos e atravessou o Mediterrâneo até se fixar em Turim: uma sequência de
peripécias, que poderiam ter arruinado aquela mortalha, se não tivesse havido
um empenho tão grande em a preservar.
Pouco mais
havia a dizer, durante muitos séculos. As pessoas continuavam a guardar aquele
pano com grande devoção, porque os documentos asseguravam que tinha estado em
contacto com o corpo morto de Jesus Cristo, mas não sabiam mais dessa relíquia.
É certo que a guardavam num estojo muito rico, lhe construíram uma capela
valiosa, numa igreja deslumbrante, mas apenas por causa destas notícias,
transmitidas de geração em geração. Aquele pano sujo de sangue não parecia
acrescentar mais informação.
No último
século, a técnica fotográfica revelou o que ninguém tinha imaginado antes. Ao
tirar uma fotografia (em negativo), verificou-se que o negativo aparecia como
um positivo. Isto é, o lençol era uma imagem negativa! A imagem quase abstracta
tornou-se perfeitamente clara, na fotografia. O interesse cresceu,
multiplicaram-se as investigações e, agora que a imagem fazia mais sentido,
empregaram-na para reconstruir as feridas e as feições de Jesus. Por todos os
sinais, conseguiu-se perceber como é que tinham decorrido a flagelação, a
coroação de espinhos e a crucifixão. Quando os especialistas em medicina legal
reconstituíram estes factos, os historiadores ficaram assombrados, porque os
pormenores coincidiam exactamente com os hábitos romanos de crucifixão da época
de Jesus.
Regularmente,
este lençol de Turim, conhecido como «Sudário», é exposto para ser visto de
perto pelos fiéis (sobretudo fotografado, porque é na fotografia que a imagem
se revela melhor). Neste momento, está acessível na catedral de Turim, que o
Papa Francisco irá visitar no próximo Domingo 21 de Junho.
Um dos
secretários do Papa, o padre egípcio Yoannis Lahzi Gaid, publicou recentemente
um livro(1) contemplando a Paixão de Jesus com base na imagem do
Sudário. Como o Pe. Gaid tem o Papa à mão (privilégios de secretário),
conseguiu que ele lhe escrevesse o prefácio do livro. O texto do Papa Francisco
é uma meditação maravilhosa sobre Jesus, em tom de oração: «Faz, Senhor, que eu
Te possa ver hoje nos rostos desfigurados, nos corpos sofredores de todos os
tempos, nas pessoas descartadas, marginalizadas e esmagadas pelo peso das suas
cruzes (…) Faz, Senhor,
que eu seja uma imagem de Ti, o teu Sudário, para testemunhar aos homens do
nosso tempo o abraço do teu amor inefável!»
Pormenor
do Sudário: a imagem negativa aparece como positiva.
Mais
imagens disponíveis em: www.sindone.org/diocesitorino/s2magazine/css/0/sindone2014/telo/index.html)
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José Maria
André
7-VI-2015
Publicado nos jornais
«Correio dos Açores»,
«ABC
Portuguese Canadian Newspaper» e «Verdadeiro Olhar»
Vem a propósito deste misterioso negativo, demasiado antigo para os conhecimentos
humanos, a entrevista(2) a Miriam, uma criança do Iraque que teve de
fugir ao ataque devastador dos fanáticos do Daesh, aqui a falar com uma serenidade e sabedoria de vida extraordinárias,
muito para lá das possibilidades de um QE fabuloso! Tudo com um sorriso meigo,
como se a condição de refugiada fosse fácil. Só a resposta que dá ao
entrevistador sobre a forma como encara os seus cruéis perseguidores por quem reza
a Deus para que lhes perdoe, já se percebe que está noutro campeonato! Claro que ela lhes perdoou, como diz tranquilamente,
a dada altura. Até o entrevistador fica atordoado, insistindo com a miúda, para
perceber se teria bem a noção do que estava a afirmar. O olhar lúcido e a
escolha certeira das palavras não deixam margem para dúvidas, transmitindo uma
paz imensa, que rasa o inexplicável. Sim, é ela que nos pacifica. Poderíamos ficar-nos
por lhe reconhecer uma maturidade muito acima dos 10 anos. Mas haverá alguma idade
em que uma reacção desta grandeza e fé seja comum? Convenhamos que tudo o que Miriam
diz e é, suplanta a escala da maturidade.
https://m.youtube.com/watch?v=_ige6CcXuMg
Fica-se sem palavras
depois do testemunho desta criança inspirada e de uma bondade transparente.
Maria Zarco
(a preparar o próximo gin tónico, para daqui a 2
semanas)
_____________
(1) Título do
livro de meditações do padre egípcio de rito copta: "Via Crucis dalla Bibbia alla
Sindone" (Via Sacra, da Bíblia ao
Sudário)
(2)
Postado a 26 de Fevereiro de 2015 no Youtube,
remetendo para o site http://www.wazala.org/2014-02-letters-from-egypt/ com
relatos e entrevistas a vítimas do DAESH (ISIS).
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